quarta-feira, 26 de setembro de 2012

OS CHARLATÕES


(De Soares a Passos)


                                                                     
Mário Soares convenceu-se que só por lhe chamarem (sabe-se lá porquê!) o pai da democracia, podia fazer tudo o que lhe apetecesse. Por isso, soltou foguetes, em Março de 1975, com a nacionalização da banca, garantindo que, agora, sim, o 25 de Abril estava totalmente realizado, com o «25 de Abril económico». Que tinham sido, «finalmente, afastados os grandes suportes da ditadura». Sim, ele disse isto.

Depois, mal se apanhou com o poder na mão, foi buscar os banqueiros e, daí a tempos, estava a pedir ajuda ao FMI. Começou a destruir o aparelho produtivo nacional, coisa que estava intimamente relacionada com a adesão à então designada CEE. Haveria de ser presidente da República, onde se entreteve a dar várias voltas ao mundo. Depois de ter cavalgado os burros autóctones, chegou a cavalgar uma tartaruga, nas Ilhas Galápagos.  Hoje, nas horas vagas, e sempre que o governo não é do PS, dá uma – ou duas – de esquerda.

Cavaco Silva convenceu-se que depois das asneiras de Soares, que afundaram o país – e com os fundos comunitários a jorrar – a coisa estava no papo. Seria sempre a aviar. Estoirou tudo em cimento e a deixar os amigos encherem os bolsos – a verdadeira mãe-de-água do BPN, que viria a ser a maior burla alguma vez acontecida em Portugal. Delapidou ainda mais o aparelho produtivo nacional, até que foi forçado a «retirar-se», em grande parte empurrado por aqueles a quem enchera a mula. Comprou bem umas acções fantasmas, vendeu-as melhor, fez umas transações imobiliárias jeitosas e começou a pensar da presidência dos matarruanos, o que viria a conseguir. Hoje, não ganha para as despesas. Nem para se ralar.

António Guterres convenceu-se que depois de Cavaco e da sua gestão, que afundou o país, tudo o que viesse (que, por acaso, era ele) seria uma bênção. Bom rapaz, católico praticante – é o que consta – teve o primeiro susto ao inteirar-se do verdadeiro estado do país. Passou uns dias no Hospital da CUF, a recuperar do abalo.

Sabendo a escória que tinha no partido, resolver rodear-se de «gente nova e promissora», para o que foi buscar jovens ambiciosos e sedentos de sucesso. Sócrates e Vara, por exemplo. Não há job para boys, foi a sua frase mais sonante – e também aquela que teve menos correspondência na realidade. Os rapazes «ambiciosos e sedentos de sucesso», que tinham chegado a Lisboa aos trambolhões, logo se deslumbraram, como alguém disse, com as luzes da cidade, com os restaurantes da cidade, com os automóveis da cidade, com os bancos – e os banqueiros – da cidade, com os negócios da cidade, enfim, com as possibilidades da cidade, principalmente quando se tem o poder nas mãos.  

Um dia, depois de eleições autárquicas que não correram nada bem, reparou que estava atolado num pântano. E fugiu. Encontra-se, hoje em dia, refugiado no Alto Comissariado da ONU para os Refugiados, onde trata de si e, se houver tempo e verba, dos outros refugiados.

Durão Barroso convenceu-se que depois do pântano de Guterres, onde o país se afundara, nada de pior podia acontecer. Cedo descobriu que o país não só se afundara, como estava de tanga. Percebendo isto, piscou o olho a Bruxelas e, certamente por bruxedo, conseguiu fugir para lá, onde é presidente da Comissão Europeia. O país ficou ainda mais atascado – e a tanga mais esfarrapada. Ele está muito bem da vida, e quase ninguém se lembra dos seus tempos de esforçado MRPP.

Sócrates convenceu-se que era um génio e um protegido dos deuses. Se os seus antecessores lhe legaram um país de pantanas, e estavam todos bem na vida, ele tinha todas as condições para fazer mais e melhor. E fez. Alargou o pântano, vendeu a tanga e elevou à décima potência tudo o que de pior antes dele fora feito. Pelo meio, descobriu que o pântano era o sítio ideal para deitar toda a espécie de lixo, incluindo os lixos morais. O pântano passou a borbulhar. Como o país integrava um espaço económico livre a alargado como nunca o fora, todos os tipos de traficâncias passaram a ser permitidas.

Empenhado nestas proveitosas veniagas, não percebeu que o enriquecimento de uns quantos – ele incluído – não era o enriquecimento do país. Pelo contrário: agora, nem água pantanosa havia. Não quis acreditar no que via, e deu por si a acreditar, delirantemente, sabe-se lá em quê. Já na fase de estrebucho, pediu ajuda externa, mas, tal como Guterres e Durão, achou melhor mudar de ares. Juntou uns dinheirinhos que arrebanhara no meio de várias confusões – confusões, não: só cabalas e campanhas negras – e foi viver em Paris, onde é, finalmente, um nababo. Às vezes vem almoçar ou jantar a Lisboa, só para ver como param as modas. Pescar à linha. Diz-se por aí que se não foi internado num hospício, ou num estabelecimento prisional, é porque não há medicina que o trate, ou porque a Justiça está entregue à rainha de Inglaterra, que não tem poderes para o efeito.


Passos Coelho convenceu-se de várias coisas. Uma, é que lhe bastava dizer que herdara um país falido. Outra, é que era um génio maior do que Sócrates. Outra, é que o povo, tal como disse, com mágoa, Erasmo de Roterdão, é uma enorme e possante besta.  Outra, é que, dados os factos, tinha força, autoridade e competência para aplicar as medidas que entendesse. Outra, é que tinha o seu partido com ele e o CDS na mão. Outra, é que bastava agradar aos donos do dinheiro para poder fazer o que bem lhe desse na gana, e ainda o que o Gaspar mais o Relvas, aconselhados pelo Borges, lhe dissessem. Outra, é que era um homenzinho a sério, e não um fedelho com umas ideias neoliberais aprendidas à pressa nos meandros da JSD e trabalhadas qb num curso de economia tardio, para justificar um estatuto.

Convencido disto tudo, foi o «custe o que custar». Como ele nunca soube o que foi «custar», porque nunca trabalhou, nem o Gaspar sabe o que é ser gente comum, tal como o guru António Borges, que aos dois aconselha e é, em certa medida, o primeiro-ministro sombra, perdeu o controlo da situação. O seu partido logo percebeu que assim não vai lá nas próximas eleições, razão pela qual – não, claro que não é por causa do país, nem das pessoas – lhe começou a tirar o tapete. E Passos, tal como um garoto cobardolas e inconsciente que apenas sabe produzir uns lugares-comuns em voz estudada para impressionar os papalvos, aí está, a padecer do síndroma de Peter e sem saber que contas deitar à vida. Pela primeira vez, em mais de quarenta anos, tem um problema para resolver.


E O POVO PORTUGUÊS? Ter-se-á, finalmente, convencido

- que de Soares a Passos, nenhum se aproveita?

- que o problema não é só de pessoas, mas das políticas que aplicam?

- que TODOS estes governantes, cada qual com o seu carácter (desprezível, em qualquer deles, como se vê) são corresponsáveis pela miséria a que o país chegou?

- que no actual quadro político-partidário não há saída, nem recuos, nem remendos, nem soluções?


Sim, foram bonitas as manifestações, pá! Mas não creio que elas signifiquem, para além da justa revolta pelas medidas impostas pela mais desbragada austeridade, pelo esbulho e confisco que ela provoca, a consciência plena de que estes alegados governantes – TODOS ELES – são apenas os executores de políticas económicas determinadas de muito longe por gente sem rosto. Gente que ninguém elege.

Gente que nos empresta o dinheiro que nos foi roubado. Dinheiro para essa gente transferido pelos governos dos países.

Não basta, por isso, deitar abaixo um governo. É preciso deitar abaixo quem, realmente, comanda os povos, através dos governos. Ao mandarmos Passos para a rua, devemos exigir que «o senhor que se segue» não leia pela cartilha de Passos, Sócrates, Durão, Guterres, Cavaco ou Soares.

No fundo, é isto:

NACIONALIZAR OS INVESTIDORES. OS MERCADOS.

- A União Europeia não deixa? Problema dela.

- Os EUA não gostam? Problema deles. Na América Latina mandam cada vez menos, e «aquilo» já foi o seu pátio das traseiras.

Eu não tenho medo da Liberdade. E tu?

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

DONA CÂNDIDA, A CÂNDIDA


Portugal não é um país corrupto, descobriu Dona Cândida de Almeida, alta figura do PS e da Justiça portuguesa. Convidada a perorar numa iniciativa do PSD, chamada Universidade de Verão (conclave dos jovenzinhos que medram na juventude partidária dos laranjas enquanto não arranjam tachos nas empresas dos amigos, ou jobs na administração pública, incluindo cargos de assessores de ministros e secretários de estado, como tirocínio para futuros governantes), Dona Cândida, candidamente, disse que «Portugal não é um país corrupto» e que existe uma «percepção» exagerada da dimensão deste crime, sublinhando que é dos poucos Estados europeus onde se investigam «grandes negócios do Estado».

Digo eu: esta senhora parece confundir investigar com acusar, julgar e – se for caso disso – condenar. Investigar, lá isso investigam. Mas depois… ignoram factos, destroem provas e face a isso, arquiva-se.

Continua a dizer a senhora dona: «O nosso país não é um país corrupto, os nossos políticos não são políticos corruptos, os nossos dirigentes não são dirigentes corruptos. Portugal não é um país corrupto. Existe corrupção, obviamente, mas rejeito qualquer afirmação simplista e generalizada de que o país está completamente alheado dos direitos, de um comportamento ético (...) de que é um país de corruptos», disse a ilustre directora do Departamento Central de Investigação e Acção Penal na tal Universidade de Verão do PSD, em Castelo de Vide.

Sem se rir, mas abanando muito a sua augusta cabeça, acrescentou que «as pessoas, de uma maneira geral, sem saber exactamente o que estão a dizer, falam de corrupção num conceito sociológico, ético-político eventualmente, mas falam de coisas que não são corrupção, falam de coisas afins», disse, acrescentando que «a corrupção tem a ver com cidadãos ou funcionários que se vendem ou querem vender-se».

Digo eu que a madame chegou à Terra há oito dias, mais dia, menos dia, razão pela qual desconhece os casos Freeport, Portucale, Submarinos e Face Oculta, já para não falar da Fundação para a Prevenção e Segurança, também conhecida por Fundos para o PS. Também nunca ouviu falar de Melancia, Abílio Curto, Felgueiras, Isaltino, Vara, Penedos, Godinhos e outros tantos. E que tais.

Mas continua sua excelência: A nível do combate a este crime, «Portugal está na média europeia» e é até um dos países que vai mais longe na investigação deste tipo de ilícito, dando como exemplo o processo judicial relacionado com a compra de submarinos pelo Estado português.

Digo eu: a eminente criatura desconhece que o caso dos Submarinos já provocou condenações na Alemanha, onde se provou que houve corruptores, faltando apurar, em Portugal, quem foram os corrompidos. Talvez nunca se apure, a julgar pelo que pensam – e dizem e fazem – certos altos magistrados. Vejam lá que até documentos essenciais do contrato de compra dos submarinos desapareceram, tendo outros sido encontrados no gabinete de uma importante firma de advogados!

Mas Dona Cândida continuou, imparável: «Temos feito efectivamente o nosso trabalho (...) Ninguém nos impediu e, portanto, se vocês virem a nível europeu (...) não vêem ninguém a ser investigado. Não há investigação de grandes negócios do Estado e que interessam ao Estado. E nós têmo-lo», afirmou.

Digo eu: Não há dúvida. Esta senhora chegou há pouco de Marte. Por um lado, Freeportes, Submarinos, Portucales, Aeroporto de Macau, etc, etc, não consta que proliferem na Europa civilizada. Por outro lado, ela nem sabe que, na Suécia, uma vice-primeira-ministra foi demitida por comprar um chocolate com o cartão do governo. Está bem. Isso é que é grave. Se fosse corrupção a sério, não acontecia nada. Cá, investiga-se, ignoram-se factos, destroem-se provas… e, na maior das calmas, arquiva-se.

E continuou ela, parecendo cada vez mais destrambelhada: um dos aspectos a melhorar, disse, é a questão do lobby, cujas fronteiras com os crimes de tráfico de influências e de corrupção são pouco claras. «Enquanto lá fora isto está regulamentado, em Portugal não está. E isto tem servido de panaceia para estas situações. E portanto quando há qualquer coisa, é lobby», explicou.

Digo eu: afinal, sempre há corrupção por cá. Pode é andar disfarçada de lobby, porque o lobby, cá, não está regulamentado. Que chatice, não é, Dona Cândida? Só uma pergunta: a que horas é que V. Exa. usou da preciosa palavra? Foi de manhã, ou da parte da tarde?

Depois, Dona Cândida em defesa da sua dama, não podia ser mais explícita: quando o «engenheiro» veio à baila, aí mostrou o que vale. Uma jovenzinha do PSD disse não entender como é que pessoas sobre as quais existem «fortes suspeitas» são investigadas e detidas, ainda que preventivamente, e isso não acontece com o anterior primeiro-ministro, José Sócrates, referindo que Sócrates vive e estuda em Paris, levando «uma vida de grande luxo com o dinheiro dos salários que ganhou em Portugal», e questionou se o ex-primeiro-ministro terá alguma protecção diferente.

Na resposta, Cândida Almeida referiu a incapacidade do Ministério Público para comparar declarações de património e património real. «Vamos instaurar o inquérito por suspeitas de quê?», questionou. «Hoje é este, amanhã é aquele e então é uma caça às bruxas e nós não queremos nenhuma república de juízes. Somos magistrados, devemos cumprimento à lei, as investigações seguem os termos da lei, os termos do processo penal, não há nem pode haver nenhuma república de juízes», afirmou. «Imaginem o que era os magistrados agora dizerem: vou ver a conta daquele e agora vou ver a conta deste. Isso acaba por ser também um perigo maior para a democracia», reforçou.

Digo eu: pronto! Finalmente. V. Exa., Dona Cândida, explicou-se! Disse, abertamente, isto: Claro que não podemos investigar o Sócrates, porque depois havia quem quisesse investigar o Cavaco, e logo outro a querer investigar o Soares, e outro a querer investigar o Relvas, ou o Jorge Coelho, e ainda outro a determinar que o Portas também fosse investigado. Bom… era o fim da República. Caíam todos! Ao dizer isto, V. Exa estava a dizer claramente à rapaziada do PSD que o melhor é não levantar muitas ondas, porque todos têm telhados de vidro, e ela, melhor do que ninguém, sabe disso. Assim como quem diz: Vejam lá se não vão à lã… e vêm de lá todos tosquiados.

Peço desculpa, Dona Cândida. Vossa Excelência é mesmo deste planeta e deste país. E sabe bem o que é a corrupção e quem são os grandes corruptos. Nisso, devido ao cargo que ocupa, V. Exa é mesmo uma especialista na matéria. Eu é que não sou de cá, nem do seu planeta, nem do seu país.

E deixe-me que lhe diga: Felizmente, porra!


(João Carlos Pereira)