quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

RI-TE, RI-TE...

Enquanto Cavaco provava lindos chapéus e pedia aos portugueses para fazerem filhos, Durão Barroso descobria que o nível do desemprego entre os mais jovens era «inadmissível». A descoberta ainda lhe ficou melhor que o chapéu na cachola do senhor presidente, cujo sorriso, no acto da prova, faria inveja ao riso das vacas que ele, por sua vez, vislumbrou nos Açores, aqui há uns tempos atrás. Chapéus e desempregados há muitos, e palermas, pelo que se vê, ainda há mais. Talvez fosse por isso que as vacas se desmancharam a rir.

Quando falo em palermas, estou a pensar, naturalmente, nos mais de um milhão e duzentos mil portugueses que estão desempregados, sendo que grande parte deles é duplamente palerma, pois terá acreditado que Passos Coelho, conforme garantiu em campanha eleitoral, não iria aumentar os impostos, nem cortar nos subsídios de férias e de Natal, nem juntar mais austeridade às medidas de austeridade que os PEC’s socialistas – com o seu aval, aliás – já tinham imposto. Medidas que, como se sabe, provocam mais e mais desemprego. Mas se o senhor presidente quer que os portugueses forniquem com sentido reprodutor – não fornicar por fornicar, mas fornicar para procriar – porque não leva a sua ânsia repovoadora mais longe e sugere ao senhor Durão Barroso que promova uma qualquer directiva comunitária que nos obrigue a colocar os desempregados jovens de ambos os sexos – que serão os que, sexualmente, mais activos estarão – a fornicar em Centros de Reprodução da Espécie, onde deveriam, em nome da pátria e dos seus superiores interesses, satisfazer as suas necessidades sexuais e, ao mesmo tempo, as necessidades demográficas do país? Uma espécie de Casa dos Segredos, mas através de uma Parceria Público-Privada (PPP), já que o país não avança sem que, pelo meio, haja sempre o formigueiro do lucro a estimular os dedos, não sei se me faço entender.

É claro que as crianças nascidas nestes Centros não seriam propriedade do Estado nem dos seus progenitores, mas dos investidores privados da tal PPP, que promoveriam a sua educação, tendo em vista criar uma nova espécie de trabalhadores verdadeiramente exemplares, livres de ideias perniciosas, tais como salário, horário, férias, direitos, descanso, família e outros vícios das sociedades contemporâneas, origem da crise que aí está. Só então se poderá dizer que, finalmente, se vive em democracia.

Ri-te, ri-te…








Crónica lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 29/02/2012.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

E DEPOIS?

Quando já não houver mais nada para vender, como é que o governo vai pagar a dívida e os juros? Não pode ignorar-se que, segundo dados do próprio Governo, por 78.000 milhões de euros disponibilizados pela troika, o Estado terá de desembolsar 112.400 milhões, já que, só de juros, pagaremos 34.400 milhões, ou seja, 44% do montante do empréstimo. Não sei se já perceberam que nunca produziremos riqueza suficiente para pagar o que devemos, fundamentalmente porque sucessivos governos entregaram a nossa capacidade produtiva a troco de uns fundozitos para construir estradas e auto-estradas, todas elas agora desertas – mas portajadas –, para além de uns trocos para acções de formação, que desapareceram nos bolsos de espertalhões arrimados aos partidos do poder, sem formar fosse quem fosse, ou no que quer que fosse, salvo na arte da ladroagem.
A venda da EDP e da REN, que deixava nos cofres do Estado milhões de euros, acabou também com esse encaixe. Para cúmulo, até os milhões de euros relativos aos lucros do exercício de 2011 vão direitinhos para os bolsos dos compradores chineses, embora nesse ano ainda nem sonhassem ser donos dessas empresas. Isto sem falar do facto, ainda mais grave, de entregar a estrangeiros todo o nosso sector energético, o que significa que TODA A NOSSA ECONOMIA fica nas mãos de interesses que não são os nossos. Mais tarde, venderão a água, das nuvens aos rios, as praias e toda a orla costeira, talvez a Serra da Estrela e o parque Natural da Peneda Gerês, oferecendo, como bónus, a Arrábida e as Berlengas. Mesmo assim, iremos continuar a pedir dinheiro para pagar a dívida e os juros, porque há muito que deixámos de ser economicamente viáveis. E porque as dívidas – e os juros – serão cada vez maiores.

De seguida, dissolverão as Forças Armadas, porque não há dinheiro para as sustentar, já que os militares insistem em ter ordenado, carreiras e fardas, exigências que um verdadeiro patriota nunca deveria fazer. Venderão, consequentemente, os novos submarinos, os carros de combate e o Castelo de S. Jorge. Feitas as contas, o Gaspar vai dizer que não chega, daí que se venderão as escolas, os hospitais, os centros de saúde e os tribunais. E quem quiser estudar, tratar-se ou recorrer à Justiça, emigrará e, no país de destino, tratará desses pequenos detalhes.

Claro que não haverá dinheiro para as reformas e pensões, nem para salários, a não ser para os senhores administradores, membros do governo, assessores, adjuntos, especialistas, comentadores, analistas, deputados, autarcas e afins.

Aqui chegados, perguntará alguém:

– Então, e depois? Continuamos a pagar impostos, se o Estado, vendida a última pedra, e fechada a última porta da última repartição, já não gere seja o que for?

Claro, então, de que é que viveriam os senhores administradores, membros do governo, assessores, adjuntos, especialistas, comentadores, analistas, deputados, autarcas e afins e, principalmente, os investidores?







Crónica lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 22/02/2012.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

PIEGUICE? CLARO QUE NÃO! CACHAPORRA? CLARO QUE SIM!


Mais de um milhão de portugueses queixam-se de estar desempregados, sem perceber que estão, apenas, a sacrificar-se para salvar os interesses da Economia. São uns reles pieguinhas, que põem os seus interesses acima da pátria.

Mais de dois milhões e meio de portugueses queixam-se de viver abaixo dos índices oficiais de pobreza, maneira gentil de dizer que estão na miséria. Outra pieguice insuportável, denotadora de um egoísmo atroz, pois não percebem que até há quem viva ainda muito pior. Ou, se calhar, queriam ser todos Belmiros, Soares dos Santos, Berardos ou Amorins…

Mais de 34.000 famílias deixaram de poder pagar a prestação da casa, e queixam-se de, por razões a que são alheias (desemprego ou perda de poder de compra, por exemplo), se arriscarem a dormir ao relento. Pieguice inaceitável, pois o nosso clima não é assim
tão inclemente.

Mais de 50 mil jovens, grande parte deles com formação universitária, arrastam-se à procura de um primeiro emprego, queixando-se de não terem uma oportunidade para constituir família ou garantir a sua independência económica. Pieguinhas sem vergonha na cara, que já deviam ter abalado por esse mundo fora, num êxodo que teria tanto de patriótico como de aventureiro. Ah, não querem emigrar? Então, não se queixam, que este país não sustenta piegas.

Mais de 12 empresas – por dia! – declararam falência em Portugal, fora aquelas empresas que não declaram nada e se limitam a baixar taipais. Todos se queixam que o negócio deixou de dar. Ninguém compra, nem com descontos de 70%. São uns piegas, estes pequenos e médios empresários. Olha, se se dedicassem ao fabrico de pastéis de nata, já estariam ricos e a exportar para a Patagónia.

Milhares de utentes do SNS queixam-se de lhes estar a ser vedado – ou dificultado – o acesso a meios auxiliares de diagnóstico e tratamentos, como a despistagem do colesterol ou sessões de fisioterapia. Pieguice intolerável e um mau exemplo de comportamento irresponsável. Não basta a esta gente estar viva, ainda quer estar viva e sem a mínima dorzinha. Comprassem seguros de saúde aos privados. Se calhar, querem levar o dinheiro para a cova…








Mas andam por aí uns mariolas que acham que com pieguices e lamúrias não vamos lá. Também acho. Faz-te homem, Zé, deixa-te de pieguices e lamentos, agarra num valente cacete e vá de corrê-los todos à cachaporrada.

Mas daquela de criar bicho.








Crónica lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 15/02/2012.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

ANTES E DEPOIS É QUE ELES SÃO BONS!

Farto de dar voltas à cabeça para encontrar algo de novo para vos contar, pus-me a passear pela Net. De blogue em blogue, vi um texto que me pareceu interessante para aqui vos dar uma lufada de ar fresco – prosa nova, dados novos – e divulgar uma verdade despercebida, mas que nos explica a mentira em vivemos. Cá vai, então, com a devida vénia a António Vilarigues e ao seu blogue, O Castendo, uma preciosa ajuda para nos ajudar a perceber alguns truques da malandragem que por aí vai.

«Por razões profissionais, nos últimos 20 anos escutei, como oradores/conferencistas, quase todos os membros do actual governo (e dos anteriores de Guterres, Durão e Sócrates). E a esmagadora maioria dos seus apoiantes, ditos especialistas, tecnocratas e quejandos.

Do que ouvi retive de TODOS eles três ideias centrais:

1. Os Recursos Humanos são os principais activos de uma empresa. E de uma sociedade. Assim devem ser tratados como tal;

2. O modelo de salários baixos, como factor de produtividade e de competitividade das empresas portuguesas, pelo menos desde 1995 que está esgotado;

3. Os factores essenciais que pesam de facto na produtividade e competitividade do país são:
- os da nossa fraca especialização produtiva;
- as debilidades que apresenta a nossa economia na criação e difusão de tecnologia;
- a deficiente organização e gestão das empresas e do processo produtivo;
- a educação e a formação, incluindo, nomeadamente, as de empresários (sistematicamente inferior às dos trabalhadores, pelo menos desde 1992) e quadros dirigentes;
- os custos da energia, da água, dos combustíveis, das comunicações, dos transportes e do dinheiro, em muitos casos superiores em relação à média comunitária;
- e que não é a intensificação do trabalho, nem a redução dos salários que resolverá o problema da menor produtividade e competitividade do país.

Qual é o meu «espanto» ao vê-los, uma vez transfigurados em governantes, a defender o contrário do que anteriormente proclamavam.
E, sublinhe-se, a inversa também é verdadeira: saídos de governantes e regressados aos seus afazeres profissionais, é ouvi-los a perorar a mesma lengalenga sobre os recursos humanos, os baixos salários, a produtividade e a competitividade.
Será porque ganham em média por 1 hora de conferência cerca de 5 mil euros (o que um trabalhador que receba o salário mínimo nacional não aufere num ano)?
Ou será que a mentira e a sem vergonhice lhes estão na massa do sangue?».
Ora aqui estão duas perguntas a que as pessoas sérias e lúcidas responderão sem dificuldade. As outras, essas, ou ficam caladas, ou dizem duas ou três idiotices. E essas, para mal de todos nós, ainda são a maioria.








Crónica lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 08/02/2012.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

SE O 25 DE ABRIL FOSSE VIVO…

Enquanto Catroga se preparava para receber, da EDP, só por passar por lá de vez em quando, uns pentelhos dourados (a juntar à suculenta pentelheira da sua reforma), o ministro Álvaro sugeria que o país se transformasse na República do Pastel de Nata. Ao mesmo tempo, o resto do governo – ou quase – insistia na necessidade de os portugueses emigrarem, que este país não está para aturá-los. Que fossem morrer longe.


Pela mesma altura, o governador do Banco de Portugal avisava que as medidas de austeridade não iam chegar, porque o remédio para a crise está como a emenda do tal soneto: é pior que a doença. A confirmar isso, a agência de notação financeira “Standard & Poor's” decretou que a credibilidade de Portugal estava ao nível do lixo, coisa que não me surpreende, porque há muito tempo que eu ando a dizer que este país é uma lixeira. Um mês depois, Cavaco confessou que vivia acima das suas posses. Passos Coelho, sem saber para que lado se há-de voltar, entrega ao ministro Gaspar a solução da crise: a do costume.


Aflita, a UGT cumpriu a sua obrigação e deu uma mãozinha ao Governos e ao grande patronato. Sendo assim, o remédio é alargar as cargas horárias, reduzir ordenados e pensões, aumentar os preços dos bens de primeira necessidade, da alimentação à Saúde, dos transportes à Educação, sem esquecer, naturalmente, os impostos. Mas… esperem aí: não se viu já que esta emenda é pior que o soneto? Que as coisas assim, em vez de melhorar, só podem agravar-se? Não caiu o PIB 3,1%? Não aumentou o desemprego para números nunca vistos? Não fecham, todos os dias, dezenas de empresas? Não aumenta o crédito malparado? Não entregam as famílias aos bancos 19 casas por dia? Não sobe, em espiral, a criminalidade, esperando-se que assuma, a qualquer momento, índices de extrema violência? Não se acumulam suicídios sobre suicídios, havendo pressões enormes sobre a comunicação social e as forças de segurança para que não divulguem essas situações?


Soares inventou os contratos a prazo, os salários em atraso e foi o primeiro a chamar o FMI. Quando foi corrido, declarou-se um pássaro a quem abriram a gaiola. Cavaco perdeu dez anos e muitos milhões em fundos comunitários, e foram os seus pares do PSD que lhe tiraram o tapete. Guterres mergulhou num mar de despesismo e veio à tona num pântano; pirou-se. Barroso, mal descobriu onde se metera, mandou a pátria às malvas, passou a tanga ao Santana e emigrou com pompa e circunstância. Sócrates esgueirou-se, durante seis anos, entre o manicómio e a prisão, antes de ir perguntar à Sorbonne se podia fazer exames por e-mail e ser doutorado ao domingo.
E um grande capitalista, que passava o tempo a pregar patriotismo e a pedir sacrifícios aos portugueses, optou por pagar impostos na Holanda, tal como já fazem 19 outros patriotas do PSI 20. Não há dúvida. Os trabalhadores são uns patifes…


É verdade: se o 25 de Abril fosse vivo, faria 38 anos daqui a três meses.



(João Carlos Pereira)



Crónica lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 01/02/2012.