Não se pode financiar o Estado Social?
Ai
pode, pode!
O
ministro das Finanças disse que não é possível financiar funções e prestações
sociais do Estado que a sociedade não está disposta a pagar. Ao afirmar um
disparate destes, sujeita-se o ministro a ser considerado uma de duas coisas:
um enorme atrasado mental; ou um grandessíssimo patife. Apesar das muitas e
caridosas opiniões em contrário, opto pela segunda possibilidade. Não só é
falso que a sociedade não esteja disposta a pagar o Estado Social, como é
verdadeiro que sempre o esteve a pagar. E a pagar bem.
O
que acontece – e disso, sim, se pode culpar a sociedade - é que são escolhidos
governantes que são inimigos declarados do Estado Social. Gente que considera
que TUDO, mas absolutamente TUDO, deve ser fonte de lucro para as entidades
privadas. Ou que NADA, mas absolutamente NADA, do nascimento à morte de uma
pessoa, poderá deixará de constituir um negócio para os grandes interesses
económicos.
O
ser humano é, neste contexto, algo que tem três obrigações inquestionáveis ao
longo da vida:
1
- produzir riqueza para a sua entidade patronal, nos termos que mais convier a
esta;
2
- pagar impostos sobre os rendimentos que obtiver;
3
- suportar todos os custos com a satisfação das suas necessidades, sejam elas
de que natureza forem. Como se nunca tivesse trabalhado nem cumprido as suas
obrigações fiscais.
Esta
é a sociedade ideal do ponto de vista do neoliberalismo. Tudo o que está a
acontecer em Portugal resulta da grande ofensiva que, a nível planetário, o
capital financeiro está a desenvolver para, literalmente, tomar posse de toda a
humanidade.
Quando
Gaspar diz que «não é possível financiar funções e prestações do Estado que
a mesma sociedade que deseja ter essas funções e prestações não está disposta a
pagar», omite, descaradamente, que a sociedade portuguesa, através dos
impostos que paga, mais que garante o financiamento dessas mesmas funções e
prestações. E omite que os governos – todos eles – é que, por má gestão,
frequentemente dolosa, delapidaram o erário público, esvaindo os cofres do
Estado em tortuosos esquemas de corrupção e enriquecimento ilícito (casos das
PPP), na resolução de fraudes astronómicas (caso do BPN), em despesismo nu e
cru (novos estádios de Futebol, Centro Cultural de Belém, Expo 98) e na
amamentação de uma gigantesca rede de amiguismo e favorecimentos (a imensa teia
milhares e milhares de boys e girls), onde se destacam, ainda, as vantagens e
mordomias diversas que o poder político estabelece para si próprio, enquanto
nega ou restringe os mais básicos direitos sociais a quem, por via dos seus
impostos, os deveria ter garantidos. Ou seja: o poder político desvia do Estado
Social as verbas que espalha, depois, pelos grandes interesses financeiros e no
financiamento da opulência que decidiu ser privilégio da classe política e
respectivos pajens.
E
quando Gaspar diz que o financiamento do Estado Social «não é exclusivamente
um problema económico e financeiro, é fundamentalmente um problema político»,
está a dizer, sem querer, uma grande verdade. Orçamentar verbas e geri-las é,
de facto, um problema político. Aquilo que a sociedade portuguesa paga em
impostos só não dá para pagar o Estado Social se o governo não orçamentar o
necessário para o efeito e, essencialmente, se não gerir as contas do Estado de
acordo com a perspectiva política de que o fundamental não é pôr os cidadãos a
pagar os crimes de bandos de criminosos – sendo alguns desses criminosos altas
figuras da classe política – tal como não o é estabelecer conluios com grandes
grupos empresariais , de que resulta o esvaimento dos dinheiros públicos. O
fundamental – isso sim - é garantir o direito à Saúde, à Educação, à protecção
na velhice e no desemprego.
E isto a sociedade paga. Acontece é que o governo rouba à sociedade aquilo que ela comprou. Pagando a pronto.
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