quinta-feira, 3 de janeiro de 2013


Não se pode financiar o Estado Social?

Ai pode, pode! 


O ministro das Finanças disse que não é possível financiar funções e prestações sociais do Estado que a sociedade não está disposta a pagar. Ao afirmar um disparate destes, sujeita-se o ministro a ser considerado uma de duas coisas: um enorme atrasado mental; ou um grandessíssimo patife. Apesar das muitas e caridosas opiniões em contrário, opto pela segunda possibilidade. Não só é falso que a sociedade não esteja disposta a pagar o Estado Social, como é verdadeiro que sempre o esteve a pagar. E a pagar bem.

O que acontece – e disso, sim, se pode culpar a sociedade - é que são escolhidos governantes que são inimigos declarados do Estado Social. Gente que considera que TUDO, mas absolutamente TUDO, deve ser fonte de lucro para as entidades privadas. Ou que NADA, mas absolutamente NADA, do nascimento à morte de uma pessoa, poderá deixará de constituir um negócio para os grandes interesses económicos.

O ser humano é, neste contexto, algo que tem três obrigações inquestionáveis ao longo da vida:

1 - produzir riqueza para a sua entidade patronal, nos termos que mais convier a esta;

2 - pagar impostos sobre os rendimentos que obtiver;

3 - suportar todos os custos com a satisfação das suas necessidades, sejam elas de que natureza forem. Como se nunca tivesse trabalhado nem cumprido as suas obrigações fiscais.

Esta é a sociedade ideal do ponto de vista do neoliberalismo. Tudo o que está a acontecer em Portugal resulta da grande ofensiva que, a nível planetário, o capital financeiro está a desenvolver para, literalmente, tomar posse de toda a humanidade.

Quando Gaspar diz que «não é possível financiar funções e prestações do Estado que a mesma sociedade que deseja ter essas funções e prestações não está disposta a pagar», omite, descaradamente, que a sociedade portuguesa, através dos impostos que paga, mais que garante o financiamento dessas mesmas funções e prestações. E omite que os governos – todos eles – é que, por má gestão, frequentemente dolosa, delapidaram o erário público, esvaindo os cofres do Estado em tortuosos esquemas de corrupção e enriquecimento ilícito (casos das PPP), na resolução de fraudes astronómicas (caso do BPN), em despesismo nu e cru (novos estádios de Futebol, Centro Cultural de Belém, Expo 98) e na amamentação de uma gigantesca rede de amiguismo e favorecimentos (a imensa teia milhares e milhares de boys e girls), onde se destacam, ainda, as vantagens e mordomias diversas que o poder político estabelece para si próprio, enquanto nega ou restringe os mais básicos direitos sociais a quem, por via dos seus impostos, os deveria ter garantidos. Ou seja: o poder político desvia do Estado Social as verbas que espalha, depois, pelos grandes interesses financeiros e no financiamento da opulência que decidiu ser privilégio da classe política e respectivos pajens.

E quando Gaspar diz que o financiamento do Estado Social «não é exclusivamente um problema económico e financeiro, é fundamentalmente um problema político», está a dizer, sem querer, uma grande verdade. Orçamentar verbas e geri-las é, de facto, um problema político. Aquilo que a sociedade portuguesa paga em impostos só não dá para pagar o Estado Social se o governo não orçamentar o necessário para o efeito e, essencialmente, se não gerir as contas do Estado de acordo com a perspectiva política de que o fundamental não é pôr os cidadãos a pagar os crimes de bandos de criminosos – sendo alguns desses criminosos altas figuras da classe política – tal como não o é estabelecer conluios com grandes grupos empresariais , de que resulta o esvaimento dos dinheiros públicos. O fundamental – isso sim - é garantir o direito à Saúde, à Educação, à protecção na velhice e no desemprego.

E isto a sociedade paga. Acontece é que o governo rouba à sociedade aquilo que ela comprou. Pagando a pronto.

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