Eça de Queirós escreveu O Conde de Abranhos em Novembro de 1878. Trata-se de uma sátira ao tipo de político imbecil, torpe, oportunista e hipócrita que proliferava à época. Se Eça fosse vivo, teria na casta que hoje medra entre S. Bento, Belém e as administrações das empresas públicas e privadas – os novos Abranhos – uma fonte inesgotável de inspiração. No lugar do conde, que já não os há, teríamos O Engenheiro Abranhos. No mais, seria o mesmo retrato do arrivista sem inteligência e sem escrúpulos, que em vez do fraque, cartola e colarinhos engomados, traja Armani e gravata de seda.
132 anos depois, a maioria do povo português sujeita-se a esta gente medíocre, cretina e impiedosa, porque não passa da tal «raça abjecta» de que Oliveira Martins falava. Raça abjecta, sem dúvida, porque só um povo inferior é que se deixa governar por gente como Sócrates, Cavacos, Soares ou, conforme parece que vai ser, por um Coelho qualquer. Gente que, resignadamente, se deixa explorar sem um berro, um franzir de testa, um lampejo no olhar. Gente que se habituou a ser explorada, enxovalhada, espoliada e, curvando-se, ainda agradece a chibatada. Gente que, por isso, não merece mais do que tem.
Também há mais de um século, o rei D. Carlos afirmava que Portugal era «um país de bananas, governado por sacanas». Longe andava sua majestade de imaginar que tão judiciosa sentença estaria válida no ano de 2010, depois da monarquia ter sido esburacada ali para os lados do Terreiro do Paço, a República que se seguiu se ter esvaído em barafunda e bordoada de criar bicho, dando lugar ao Estado Novo, beato e inquisitório, e este a uma democracia que, ainda mal gatinhava, foi engavetada por um renegado bochechudo, venal e ambicioso. E que logo, à frente da sua quadrilha cor-de-rosa, devolveu o povo e a nação aos nababos do costume, com o aplauso dos democratas de vários quadrantes – os Abranhos de hoje – que, à vez, se amanham à custa da manada submissa, repartindo entre si o espólio que a governança lhes consente.
Como resultado, temos cerca de dez milhões de bananas entretidos a enviar mensagens por telemóvel, quando não estão embasbacados a ver telenovelas mentecaptas, casinhas dos segredos ainda mais imbecis, ou os golos de um fedelho obtuso e vaidoso, guinado a herói nacional, tanto pelos pontapés que dá na bola, como pelas rameiras de luxo que, à custa do dinheiro que tem, leva para a cama.
Voltemos a Eça, que pôs Alípio Severo – assim se chamava o tal Conde de Abranhos – a sentenciar: «Eu, que sou governo, fraco mas hábil, dou aparentemente a soberania ao povo. Mas como a falta de educação o mantém na imbecilidade, e o adormecimento da consciência o amolece na indiferença, faço-o exercer essa soberania em meu proveito».
Eça sabia, há século e meio, o que milhões de portugueses, com ensino obrigatório, televisão, internet, telemóveis, Magalhães e universidades privadas – tipo pronto a diplomar –, não conseguem sequer sonhar.
Raça abjecta? Evidentemente! Com excepções, é claro. Mas se a regra não fosse a abjecção, não seríamos espezinhados, como somos, por esta bafienta e infame linhagem dos Abranhos.
(João Carlos Pereira)132 anos depois, a maioria do povo português sujeita-se a esta gente medíocre, cretina e impiedosa, porque não passa da tal «raça abjecta» de que Oliveira Martins falava. Raça abjecta, sem dúvida, porque só um povo inferior é que se deixa governar por gente como Sócrates, Cavacos, Soares ou, conforme parece que vai ser, por um Coelho qualquer. Gente que, resignadamente, se deixa explorar sem um berro, um franzir de testa, um lampejo no olhar. Gente que se habituou a ser explorada, enxovalhada, espoliada e, curvando-se, ainda agradece a chibatada. Gente que, por isso, não merece mais do que tem.
Também há mais de um século, o rei D. Carlos afirmava que Portugal era «um país de bananas, governado por sacanas». Longe andava sua majestade de imaginar que tão judiciosa sentença estaria válida no ano de 2010, depois da monarquia ter sido esburacada ali para os lados do Terreiro do Paço, a República que se seguiu se ter esvaído em barafunda e bordoada de criar bicho, dando lugar ao Estado Novo, beato e inquisitório, e este a uma democracia que, ainda mal gatinhava, foi engavetada por um renegado bochechudo, venal e ambicioso. E que logo, à frente da sua quadrilha cor-de-rosa, devolveu o povo e a nação aos nababos do costume, com o aplauso dos democratas de vários quadrantes – os Abranhos de hoje – que, à vez, se amanham à custa da manada submissa, repartindo entre si o espólio que a governança lhes consente.
Como resultado, temos cerca de dez milhões de bananas entretidos a enviar mensagens por telemóvel, quando não estão embasbacados a ver telenovelas mentecaptas, casinhas dos segredos ainda mais imbecis, ou os golos de um fedelho obtuso e vaidoso, guinado a herói nacional, tanto pelos pontapés que dá na bola, como pelas rameiras de luxo que, à custa do dinheiro que tem, leva para a cama.
Voltemos a Eça, que pôs Alípio Severo – assim se chamava o tal Conde de Abranhos – a sentenciar: «Eu, que sou governo, fraco mas hábil, dou aparentemente a soberania ao povo. Mas como a falta de educação o mantém na imbecilidade, e o adormecimento da consciência o amolece na indiferença, faço-o exercer essa soberania em meu proveito».
Eça sabia, há século e meio, o que milhões de portugueses, com ensino obrigatório, televisão, internet, telemóveis, Magalhães e universidades privadas – tipo pronto a diplomar –, não conseguem sequer sonhar.
Raça abjecta? Evidentemente! Com excepções, é claro. Mas se a regra não fosse a abjecção, não seríamos espezinhados, como somos, por esta bafienta e infame linhagem dos Abranhos.
Crónica lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 24/11/2010.
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