quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

O ESCRITÓRIO DE BRUXELAS

A taxa de desemprego oficial (que é muito inferior à real) subiu para mais de 12%. Por dia, quase duas dezenas de empresas declaram falência, ou limitam-se a fechar as portas. Nos últimos meses, cerca de cinco mil casas foram entregues aos bancos, por incapacidade de cumprimento das famílias e construtores. O crédito malparado não pára de subir, atingindo níveis nunca antes registados. Só nos últimos três meses, subiu 14%. O investimento é inexistente. A escassos dias do Natal, as lojas estão às moscas e nem as grandes promoções salvam as vendas. Se há um ano havia mais de dois milhões de portugueses a passar mal, o número agrava-se todos os dias, com milhares de novos pobres a aumentar o cortejo de miséria que percorre o país de alto a baixo.

Contudo, em Bruxelas, a Comissão Europeia acha pouco e diz que o governo português deve ter «perseverança e determinação para superar os fortes interesses instalados que estão no caminho das reformas». Bruxelas exige ao País que avance «rapidamente» com reformas para reduzir os custos do trabalho e aumentar a flexibilidade laboral. Em linguagem de gente, dizem que é necessário ganhar menos e trabalhar mais, a qualquer dia, a qualquer hora. Sempre ao dispor do seu amo, tal como no tempo da escravatura.




Não saberá Bruxelas que, em Portugal, se praticam já os salários mais baixos da Europa ocidental? Sabe, mas acha pouco.

Não saberá Bruxelas que o que arruinou o país foram as políticas de destruição do aparelho produtivo português, por si impostas, as famigeradas parcerias público-privadas, com juros aterradores, ou os custos monumentais da energia, para que os contratos com as renováveis gerem milhões que vão direitinhos para bolsos privados, mas pagos pelos consumidores com língua de palmo? Sabe, mas é disso que ela gosta.

Não saberá Bruxelas que um banco onde o estado investiu milhares de milhões de euros, para tapar os roubos de banqueiros e dos seus homens de mão, foi vendido – melhor dizendo: foi oferecido – por 40 milhões de euros, não se sabendo quanto mais ainda o Estado – todos nós – vai ter que ali enterrar? Sabe, mas aplaude.

Não saberá Bruxelas o que se passa com os investimentos especulativos através do crédito bancário, a que as negociatas obscenas da Bolsa deram sumiço? Sabe, mas os Mercados são assim mesmo. Não saberá Bruxelas que o país está a saque há muitos anos, acumulando-se fortunas à custa da especulação e dos cofres do Estado, enquanto o aparelho produtivo definhava e a maioria da população era esvaída sem dó nem piedade? Sabe, mas a Europa rica tem excedentes que a Europa pobre deve comprar.

Bruxelas sabe isso tudo, porque Bruxelas é o grande escritório Europeu dos interesses do capital financeiro.

E a Europa dos Povos?

Ah, essa! Daqui a duzentos anos pensamos nisso.




(João Carlos Pereira)



Crónica lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 21/12/2011.

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