Em 2011, mais de 150 mil portugueses foram obrigados a mandar o país às malvas e abalaram para o estrangeiro a tratar da vida. Desde 2007, meio milhão já fugiu daqui, números que só têm paralelo na pior época do salazarismo. Este país não está para quem trabalha. Só para quem dirige: os senhores morgados.
Este fim-de-semana, por exemplo, os senhores morgados do PSD reuniram-se em congresso (o congresso é uma coisa que serve para ser transmitida pela televisão e ter-se, assim, publicidade gratuita) e um deles – o morgado-mor – garantiu que os sacrifícios vão continuar a «sair-nos do lombo». Depois disto, o congresso podia encerrar, estava tudo dito, mas era preciso salvar as aparências e a coisa lá seguiu os seus trâmites, ou seja, a liturgia que dá àquilo tudo o ar de coisa importante e imprescindível.
Sair-nos do lombo, salvo seja, que (aos morgados) do lombo não lhes sai nada, por isso – e para isso – é que eles são morgados. Sai do meu, por exemplo, que trabalho desde os 19 anos, nunca andei a mamar à conta de nenhum aparelho partidário, não me formei à pressão aos 40 anos, nem ganhei a vida a dar lustro a cadeirões dos conselhos de administração das várias empresas de um correligionário riquinho – e também ele um senhor morgado. Nem fui comprar um curso ao Brasil. Nem à UNI, apesar de, para tanto, ter sido aliciado.Mas a plebe gosta de ver os senhores morgados, eventualmente porque a maioria de nós também gostaria de ser um senhor morgado. Como não é, revê-se nos que são – e apaparica-os. A coisa sai cara – sai-nos do lombo – mas a rapaziada parece que gosta, especialmente se o morgado for da sua simpatia. O Morgadio anda, no entanto, pelas ruas da amargura, não há dinheiro nem para fazer cantar um cego. Estoirou-se tudo em festas, festins e festarolas e, principalmente, num parte e reparte e ficar sempre com a maior parte – para os morgados, claro, e para a gente influente que lhes está por cima, os seus suseranos, a quem juraram fidelidade, e que dantes se chamavam capitalistas, mas que, hoje em dia, se chamam Investidores ou, mais eufemisticamente, os Mercados.
Como cantava Adriano Correia de Oliveira:
O Sr. Morgado vai na sege rica,
todo repimpado, ai que bem lhe fica
o chapéu armado e a comenda ao peito
e o espadim ao lado, que homem tão perfeito.
Deputado eleito, muito bem votado.
Eleições á porta, seja Deus louvado,
seja Deus louvado, seja Deus louvado.
Crónica lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 28/03/2012.