quarta-feira, 4 de abril de 2012

NÃO SEI SE ME FAÇO ENTENDER

Quando eu for grande, quero ser gestor de uma empresa pública, do tipo daquela que se chama Parque Escolar. Para ser gestor de uma empresa assim, a principal competência reside em saber escolher o partido certo e, principalmente, saber cair nas graças do seu manda-chuva. A partir daí, passo a gerir um orçamento ilimitado, a poder falhar todas as metas orçamentadas e assumir encargos incomportáveis para o país, sempre tranquilo da vida. Se, nessa altura, a boa ordem natural das coisas ainda for o que é, a empresa que ganhará a maior fatia das obras adjudicadas será aquela que tiver a dirigi-la um antigo ministro das Obras Públicas, saído do partido a que pertenço, coisa sempre muito confortável em termos técnicos e financeiros. Não sei se me faço entender.

Em alternativa a uma empresa pública, não me importarei nada de passar primeiro pelo governo, aí com um cargo de ministro ou secretário de estado, desde que possa tomar medidas que dinamizem o sector privado, especialmente na área financeira, ou no campo da energia, ou das telecomunicações, ou das acessibilidades. Estou a pensar em cenas como o BCP, BPN, Galp, Lusoponte, Portugal Telecom, EDP, Petrogal, coisas destas. É claro que, face aos meus méritos e espírito de iniciativa, se alguma destas empresas decidir que, após um mandato indeclinável, mas prenhe de sacrifício – como exige, aliás, a causa pública – poderei ser útil nos quadros da sua administração, estarei sempre disponível para continuar a sacrificar-me em prol da economia e, naturalmente – e por consequência – em prol do país, pensamento primeiro de qualquer grande empresário, apesar de, maldosamente, se dizer por aí que eles, os grandes empresários, só pensam é em aumentar os seus lucros. Não sei se continuo a fazer-me entender.Outra coisa que eu também não me importarei de ser quando for grande, no caso de falharem as anteriores, é intermediário em processos de licenciamento – coisas assim parecidas com o Freeport –, ou ter poder de decisão em matéria de urbanismo, pois acho que são áreas que exigem uma grande capacidade de análise e uma aptidão argumentativa acima da média, dado que tudo tem o seu preço, e nós não andamos cá a ver andar os comboios.

Se no meio disto tudo – ou por causa disto tudo – alguma coisa der para o torto, porreiro, pá, chama-se a Troika.

Não sei se me faço entender.







Crónica lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 04/04/2012.

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