Nem pensaram duas vezes. Uma bomba, duas bombas, mesmo no coração da capital da Noruega. Mais uma acção terrorista da Al Qaeda! Algum tempo depois, a acção terrorista estende-se a uma ilha onde estavam centenas de jovens. Várias dezenas morrem, vítimas dos terroristas. Mas onde é que estão os terroristas? Alguém viu por aí alguém de pele escura, bigode negro e ar de fanático? Nem um!
Afinal, o «terrorista» é branco, louro e de olhos claros. E não é da Al Qaeda. É cristão, civilizado e andou por partidos da extrema-direita. É xenófobo confesso e outras coisas igualmente civilizadas. Mas que grande chatice!

E, de repente, os atentados na Noruega deixaram de ser acções terroristas, e passaram a ser atentados da extrema-direita. Um dia depois, embora envergonhadamente – e muito de raspão – os atentados voltaram e merecer o epíteto de terroristas. Mas não é bem aquele terrorismo verdadeiramente terrorista, não sei se me estão a perceber.
Então, está bem. Quando as mortes são provocadas por gente de pele clara e de olhos azuis, a coisa já não é assim tão grave. Pelo menos, de terror tem apenas uns pós. Os árabes, a quem os brancos civilizados e judaico-cristãos se fartam de roubar – água, terra, casas, petróleo, vida, liberdade, direitos humanos, futuro e Vida – é que são terroristas se responderem com as armas que têm, que muitas vezes são constituídas pelo próprio corpo.
Uma horas antes dos atentado

s de Oslo, na Líbia, terra de gente escura, sete explosões fizeram-se ouvir durante a noite (que linda maneira de dizer bombardeamentos!), em zona residencial onde era suposto estar Kadaffi. Aqui, não há terror nenhum. Quando as explosões não são provocadas por um carro armadilhado, ou por explosivos amarrados à cintura, mas por sofisticados aviões da NATO, tudo é perfeitamente legítimo e, principalmente, democrático. E o sangue, ossos e carne espalhados em virtude das explosões, são, apenas «efeitos especiais» - perdão: efeitos colaterais. Aconteceu, paciência. Vítimas? Se houve, eram todas escuras…
Por outras palavras: As bombas brancas, são coisas boas e nec

essárias; as bombas escuras, são coisas terríveis. O sangue dos brancos, é mesmo sangue; o sangue dos escuros, é um líquido avermelhado e viscoso. Os brancos, podem sempre bombardear os escuros; os escuros são terroristas, se bombardearem os brancos E, principalmente: os brancos podem sempre ir à terra dos escuros buscar as coisas engraçadas que eles têm lá. Chama-se a isso desenvolvimento, progresso e, muitas vezes, ajuda humanitária.
Eu gosto muito de ser branquinho. Isto é: de pertencer a uma sociedade civilizada, cristã, democrática, honradíssima e respeitadora dos direitos humanos.
Não temos culpa é de sermos humanos de primeira qualidade, não é verdade?

(João Carlos Pereira)
Crónica lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 03/08/2011.