quarta-feira, 4 de novembro de 2009

POLVO À PORTUGUESA

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Quem me ouve – ou quem me lê – sabe que esta não é a primeira vez que toco no nome de Armando Vara, essa eminência parda do Partido Socialista, que antes de se meter na vida política era um obscuro empregadito bancário, exercendo as funções de caixa num balcão perdido da Caixa Geral de Depósitos, em Trás-os-Montes.

Homem desde há muito ligado a Sócrates, foi sócio deste, da senhora dona Fátima Felgueiras e de um certo Sobral de Sousa, numa empresa chamada Sovenco – Sociedade de Vendas de Combustíveis, Lda., que havia de estoirar após uma vida curta e atribulada. Sócrates teve o cuidado de riscar do seu currículo esta fase empresarial da sua vida, talvez porque os seus três sócios acabaram a contas com a justiça, sendo de destacar os quatro anos de prisão, com pena suspensa, que Vara já tem no seu interessante cadastro. Tudo boa gente, no entanto. Percebe-se, por isso, o cuidado de Sócrates em apagar a Sovenco da sua vida; para ter trapalhadas, dispensa a boleia de certos camaradas…

Para além desta fase bem escondida da sua vida, Vara ficou famoso por duas coisas. A primeira, foi quando participou solidariamente, como moço de recados do PS, no buzinão da Ponte 25 de Abril, no tempo de Cavaco Silva, embora depois os governos do PS viessem a manter as portagens e a permitir que este imposto medieval pago pelas populações da Margem Sul para acederem a Lisboa, sem que tenham alternativas gratuitas – só se for a nado – todos os anos seja agravado. Sem esquecer que o ditador Salazar, quando construiu a ponte e instituiu as portagens, garantiu ao país que elas acabariam mal a obra estivesse paga. E cumpriria, sem dúvida. A segunda, foi quando estoirou a bronca da famigerada Fundação para a Prevenção e Segurança, que nada mais era que um descabelado e desavergonhado meio de desviar dinheiros públicos para fins partidários e pessoais, para além de dar sustento a firmas, familiares e amigos da caterva socialista.

Quando Jorge Sampaio, perante a enormidade da desvergonha, impôs a Guterres a saída imediata de Vara do governo, o rapaz não regressou às suas funções originais na Caixa Geral de Depósitos, como seria normal. Acabado o exercício dos cargos públicos, volta-se ao que se tinha antes, mandam assim as boas regras da decência e do princípio sagrado de que não se deve tirar vantagens sociais, económicas ou de outra natureza, dos cargos exercidos voluntariamente e com alto sentido de missão, como, aliás, não se cansam de afirmar. Coitados, os sacrifícios que eles fazem a bem da nação…

Nada disso. Sua excelência foi reintegrado na Caixa Geral de Depósitos, mas como director-adjunto, passando, sem o mínimo de escrúpulos, por cima de trabalhadores mais antigos e mais habilitados para a função. Mas como um ex-ministro tem, como sabemos, direitos divinos (mesmo sendo laico, republicano, democrata e, ainda por cima, «socialista»), rapidamente passou a administrador, talvez porque, entretanto, havia conseguido obter um precioso diploma que lhe conferia uma licenciatura em Relações Internacionais. Não preciso de vos dizer onde a licenciatura foi obtida, a menos que insistam comigo. Ah! Querem que diga? Então, lá vai: foi na UNI, precisamente. Foi na mesma virtuosa universidade privada que licenciou Sócrates a um domingo, e onde a rapaziada socialista arranjava canudos num vê-se-te-avias. A quatrocentos contos a unidade.

Passado uns tempos – e com a bronca de Jardim Gonçalves e outros impolutos banqueiros do Millenium BCP – aí está o nosso ilustre ex-caixa da Caixa Geral de Depósitos e ex-ministro corrido por indecente e má figura, a ser guindado, por indiscutível mérito próprio, dados os seus comprovados conhecimentos na manipulação de notas, moedas, cheques, outros valores e coisas afins, a vice-presidente do maior banco privado português. Uma boa escolha, pois há que aproveitar ao máximo as capacidades de cada um, e Vara já tinha mostrado, sem margem para dúvidas, do que era capaz. Currículo não lhe faltava.

Mas eis que, de repente – e sem que nada o fizesse esperar – Vara é suspeito de estar metido numa grande embrulhada, falando-se em corrupção da grossa, subornos e grandes prejuízos para o erário público. Milhões andaram por aí, passando por debaixo da mesa, beneficiando gente gorda e de muito bom-nome e, em contrapartida, lesando o Estado e lixando ainda mais a nossa vida. Depois do Millenium, do BPN, do BPP, dos submarinos, dos sobreiros da Portucale, do Freeport, da Operação Furacão e de tanta embrulhada do género, aí está a Face Oculta, implicando, outra vez, gente de bago e da política, em amoroso conluio.

«Tanta vez o cântaro vai à fonte, que um dia deixa lá a asa», dizem uns, esperando que, desta vez, a justiça corte a direito, depressa e bem. «Mais uma cabala, mais uma campanha negra», garantem outros, os crentes nas virtudes imaculadas do PS, de Sócrates e da sua gente. Entretanto, uma senhora magistrada, de quem também já falei várias vezes, chamada Cândida Almeida, já foi entrevistada pela comunicação social a este propósito, e não disse nada que se entendesse. Não sei se ainda estão lembrados, mas recordo que a senhora é uma socialista dos quatro costados, várias vezes fotografada aos abraços e aos beijinhos a figuras gradas do PS, e foi ela que afirmou, sem se rir, que não tinha visto o vídeo onde Charles Smith chamava, também sem se rir nem hesitar, corrupto a Sócrates. E acrescentou. «Não vi, nem estou interessada em ver». O pior, foi que a Moura Guedes mostrou – e nós vimos e percebemos. Bem… mas a Moura Guedes também já percebeu que quem se mete com o PS, experimenta a força dos tentáculos do polvo. «Quem se mete com o PS, leva!», vociferava, com a sua habitual subtileza, Jorge Coelho, outro ilustre nome da família. Ora aí está cumprida a profecia.

Para que as coisas se esclareçam, que é o que eu quero, seria bom, no meu curto entender, que a senhora magistrada se afastasse de tudo o que meter gente do PS – e não é pouco. Em nome da transparência e dos bons costumes. Não é por nada, é só por causa daquela história da mulher de César. E também porque uma pessoa não é de ferro. Ao ritmo a que estalam por aí broncas envolvendo rapaziada socialista – socialista, salvo seja; rapaziada do PS – a senhora magistrada pode, a manter-se o ritmo até hoje verificado, apanhar um esgotamento. O passado dá-nos uma ideia do que pode ser o futuro. Abílio Curto, Melancia, Fátima Felgueiras, Sócrates, Pedroso, Mesquita Machado, Vara, Jorge Ritto, Alberto Costa (o de Macau, e que foi ministro da Justiça durante o último governo), Lopes da Mota, ou Luís Monterroso, por exemplo, são nomes que, por isto ou por aquilo, com condenações ou sem elas, constituídos arguidos, ou disso se safando, enfim, assim ou assado, deram – ou estão a dar – que fazer às autoridades e muito que pensar ao povo.

Falando de corrupção, subornos e luvas brancas, com ou sem faces ocultas, acentua-se a convicção geral de que o caso Freeport só vai bater na arraia-miúda, caso haja alguma, o que é discutível. Tal como o caso Casa Pia. No caso Freeport, dois dos implicados disseram aos investigadores que houve pagamento de luvas a políticos, mas nenhum deles assumiu esse facto formalmente nos autos, com medo de represálias através de eventuais processos por difamação. Não vá «levarem» também.

Também a assessora de Manuel Pedro, outro dos arguidos com ligações ao PS, disse que assistiu à destruição de provas informáticas, e que em 2004, durante o processo de licenciamento, houve pagamento de avultadas comissões, tendo ouvido várias conversas que confirmam essa tese, recordando mesmo uma delas, entre Manuel Pedro e João Cabral, este com ligações à empresa Freeport, em que era dito ao segundo para «se desenrascar». Aí, a comissão falada era de 400 mil euros, a que acresciam cem mil euros, que não conseguiu precisar a quem se destinavam. Falhou aí a memória da senhora, coitada, não fosse também «levar».

Veremos, agora, no que vai dar a Face Oculta, sabendo nós que o polvo existe e tem tentáculos poderosos. Tal como noutros casos, os investigadores podem ser afastados, os juízes mudados, enfim, podem ser usadas as mil ventosas que prendem a verdade e as forças tentaculares que esmagam e deformam a justiça.

Afinal… todos os dias comemos Polvo à Portuguesa. E parece que gostamos.

Olhem, meus amigos. A mim, dá-me vómitos.

(João Carlos Pereira)

Crónica lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 04/11/2009.
(Não deixe de ouvir em 98.7 Mhz e participar pelos telefones 212277046 ou 212277047 todas as quartas-feiras entre as 09H00 e as 10H00).


9 comentários:

Anónimo disse...

Entre a Maçonaria e a Opus Dei, venha o diabo e escolha.
Porque será que estes figurões pertencem sempre a uma ou a outra destas organizações que têm influência em todos os sectores do poder instituído?

Anónimo disse...

A maçonaria, a opus dei e outra organização igual, ou pior, o sionismo judaico, do qual não se ouve falar, porque os seus membros preferem manter o mais rigoroso anonimato, dado o seu carácter de seita capaz das maiores violências e infâmias. Todos os meios são, para estes criminosos, perfeitamente legítimos e justificáveis. No fundo, tantos os maçons como os membros da ópus, não passam de aprendizes ao pé dos sionistas.
Quanto à crónica, nada a dizer, a não ser aplaudir. Mas repare-se que a corrupção em Portugal já não é uma coisa excepcional, mas um modo de vida, uma questão cultural. Da nossa cultura. E que tem no PS o seu expoente máximo. Na casa socialista não se vê quem seja gente séria ou que mereça o benefício da dúvida.

Anónimo disse...

A corrupção é essencial aos negócios do Estado. Nada funcionava neste país se não se pagasse por debaixo da mesa. Tudo está organizado e elaborado, incluindo os orçamentos públicos e privados, para o dinheiro vivo que é necessário pagar em pesados envelopes. Não teríamos sequer políticos nem partidos políticos, porque eles são pagos e financiados pelos dinheiros da corrupção. Isto vale para as obras e compras do poder central, para as obras e compras do poder local, para os negócios privados, para as mais simples obras e compras. Para o excelentíssimo senhor administrador da maior empresa pública ou privada, para o senhor empregado do Fisco, para o senhor ministro, para o senhor presidente da autarquia e respectivos vereadores (especialmente o do urbanismo) esforçados técnicos, assessores, conselheiros e adjuntos e, como não podia deixar de ser, para o senhor José da Silva, reles fiscal da mais insignificante autarquia. Porque ou há moralidade, ou comem todos.

Sem falar, obviamente, na mais colorida e doce corrupção, normalmente vestida de azul e branco, e cuja moeda é o chocolate, as viagens ao Brasil, favores de prostitutas e outros mimos semelhantes.

Viva a corrupção! VIVA!

Viva Portugal corrupto e dinâmico! VIVA!

Viva a degeneração absoluta! VIVA!

Anónimo disse...

As crónicas do senhor João Pereira têm dois defeitos. Não dão para discutir, porque se limitam a relatar factos e a recordar verdades antigas ou actuais. E não agradam a ninguém, porque todos os que andam metidos na política, de uma maneira geral se sentem retratados nelas. O meu caro senhor assim não faz amigos.

Anónimo disse...

Comecei a visitar este blog e passei a ser cliente. Já o recomendei a pessoas amigas. Vamos lá a ver se não se deixa corromper. Estou na expectativa. Mantenho, por agora, o anonimato por razões compreensíveis, como, aliás, o fazem quase todos os que comentam. Há que perceber em que país vivemos e quem está neste momento de plantão a democracia. Do piorio. Por isso, os parabéns à vossa coragem.

Monte Cristo disse...

Publicado no CM de hoje, 08-11-09

«A ‘Operação Face Oculta’ não pára de surpreender todos os dias. Primeiro foi a descoberta de uma rede tentacular dirigida por um sucateiro de Ovar que conseguiu entrar em várias empresas públicas ou participadas pelo Estado, entre as quais a Galp e a EDP, dois pesos-pesados da Bolsa portuguesa.

Agora, começam a surgir notícias sobre escutas a conversas entre Armando Vara, arguido do processo e vice-presidente do BCP com funções suspensas, e o primeiro-ministro. Obviamente que não são conversas de circunstância entre amigos de longa data que fizeram uma carreira política de mãos dadas. Nada disso.

São conversas sobre negócios e amigos que atravessam dificuldades económicas e financeiras e em que ambos tentam encontrar a melhor forma de ajudar a se ultrapassar a tormenta. Lê-se e custa a acreditar que tudo isto aconteça em Portugal. É claro que pode ser tudo legal. Mas claramente não é uma situação normal. E como o País tem assistido nos últimos anos a trapalhadas e a situações menos claras em que aparece sempre envolvido Sócrates, é imperioso que na hierarquia do Estado haja alguém que seja o último bastião da confiança dos portugueses.

As sondagens podem ser negativas para Cavaco Silva, mas no meio desta selva valha-nos o Presidente da República».

António Ribeiro Ferreira - CM

Anónimo disse...

Sócrates e o PS estão metidos na Face Oculta até aos cabelos? Então isto não vai dar em nada. O senhor Procurador-Geral da República já mostrou que não está lá para arranhar o poder socialista, mas que está lá ao serviço do poder socialista. O Freeport já esclareceu isso. E enquanto assim for, Portugal será um país sem rei nem roque. Um chavascal.

Anónimo disse...

PJ fotografa Vara a receber saco de Godinho

Armando Vara e Manuel Godinho eram próximos. O primeiro é ex-ministro e à data exercia a vice-presidência do BCP, o segundo era um desconhecido industrial de sucata, com problemas na Justiça por fraude fiscal.


No início do ano, e para demonstrar a proximidade entre ambos, a Judiciária de Aveiro fez-lhes várias vigilâncias. Numa delas – anexa aos primeiros volumes do processo ‘Face Oculta’ – está documentado um encontro entre Godinho e Vara considerado suspeito pelos investigadores. As fotografias dão conta de que estavam ambos numa zona de estacionamento, com os carros de alta cilindrada parados lado a lado, e cumprimentavam-se de forma efusiva. Depois, Godinho entregou a Armando Vara um saco de papel, com asas, e o ex-ministro sorriu depois de espreitar para o interior.

Saiba todos os pormenores na edição de segunda-feira do jornal 'Correio da Manhã'.

Monte Cristo disse...

Rematando: Ali Bábá foi um homem feliz porque não viveu em Portugal. Assim, só conheceu quarenta ladrões.