quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

O ASSALTO SOCIALISTA CONTINUA

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- ou as políticas de direita no seu esplendor
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Prometi, há oito dias, que falaria, nas minhas Provocações de hoje, dos aumentos já anunciados do preço da electricidade. E vou cumprir, contando – sempre que o negócio trata de números – com a ajuda indispensável do economista Eugénio Rosa. Ele é um economista dos pobres, daqueles que pensa, como eu penso, que a Economia deve estar ao serviço das pessoas, contrariamente ao que defendem os senhores economistas ao serviço do regime, que advogam que elas, as pessoas, é que devem estar ao serviço da Economia. No fundo, o que querem dizer, lá na deles, é que as pessoas devem estar ao serviço dos grandes mercadores. Ou, para usar uma linguagem mais vulgar, ao serviço dos tipos da massa, que são quem lhes paga.

Ora, diz Eugénio Rosa que

«a entidade que controla os preços da electricidade no mercado regulado, a ERSE – Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos, cujo presidente foi nomeado pelo primeiro governo de Sócrates, anunciou que o preço da electricidade para as famílias, em 2010, iria aumentar em +2,9%. Esta subida do preço da electricidade é superior a mais do dobro da previsão para 2010 do aumento dos preços em Portugal, feita por várias entidades (OCDE, FMI, BdP), e os trabalhadores não têm garantido idêntico aumento salarial em 2010».

Segundo as contas feitas por Eugénio Rosa, cujo diploma de economista não foi passado em nenhum domingo – ou seja: é economista a sério – «se o preço da electricidade for aumentado em 2,9%, isso significará que os portugueses terão de pagar, pela mesma quantidade de kWh, mais 251,5 milhões de euros».

E garante ele que

«tal aumento de custos é inaceitável não só pelas razões referidas anteriormente, mas também porque:

Primeiro – O preço da electricidade em Portugal é já superior ao preço médio da União Europeia;

Segundo – O poder de compra das famílias portuguesas está muito abaixo do poder de compra médio da União Europeia;

E terceiro – A EDP, só nos primeiros nove meses de 2009, já arrecadou mais de 800 milhões euros de lucros líquidos».

Sócrates, atarefado a tratar dos casamentos entre homossexuais e a adjudicar obras públicas faraónicas, que são aquelas que deixam fortunas em comissões e luvas, para além de repolhudos fundos para os partidos que mexem os cordelinhos para a coisa ir em frente, não tem tempo para reparar nessas minudências. Ele, se calhar, nem sabe que, segundo o Eurostat, o preço médio da electricidade na União Europeia (a 27 países), é inferior ao preço médio em Portugal em -2,2%, mas o poder de compra médio na União Europeia (também a 27 países), medido pelo PIB por habitante, é superior ao poder de compra médio em Portugal em +31,6%.

E explica Eugénio Rosa:


«O poder de compra da população, em Portugal, corresponde apenas a 76% do poder de compra médio da União Europeia, mas o preço da electricidade no nosso País é superior ao preço médio da electricidade na União Europeia em +2,26% (se o preço da electricidade em Portugal fosse igual ao preço médio da U.E., os portugueses pagariam pela electricidade que consomem menos 190,8 milhões de euros por ano)».

E explica o economista que

«nos países onde o preço da electricidade é superior ao de Portugal, essa diferença de preço é mais do que compensada pela diferença, para mais, no poder de compra da população desses países, relativamente à portuguesa. Na Alemanha, o preço da electricidade é superior em +10,8% ao preço em Portugal, mas o poder de compra médio na Alemanha é superior ao português em +52,6%; no Luxemburgo, a electricidade custa mais 28,1% do que em Portugal, mas o poder de compra médio no Luxemburgo é superior ao de Portugal em +263,2%. Na Finlândia, Dinamarca e Noruega, o preço da electricidade é mais baixo do que em Portugal (entre -10,5% e -22,9%), mas o poder de compra médio das famílias nesses países é muito superior ao das famílias portuguesas (entre +53,9% e +151,3%).

Estas coisas não são explicadas aos portugueses – e bem podiam ser – bastando, para isso, que os grandes órgãos de comunicação social não estivessem nas mãos de quem ganha muitíssimo dinheiro devido às coisas serem assim. Mas se eles não explicam, explico eu – ou seja: explica Eugénio Rosa, a quem continuo a dar, gostosamente, a palavra:

«Devido aos elevados preços que pratica, a EDP tem arrecadado lucros muito elevados, nomeadamente após a entrada em funções do primeiro governo de Sócrates. Em 2005, que foi o 1º ano deste governo, os lucros líquidos da EDP foram superiores em +143,3% aos de 2004; em 2006 em +113,7%; em 2007 em +131,7%; em 2008 em mais 148%; e, em 2009, só nos primeiros 9 meses, os lucros foram superiores aos de 2004 em +89,7%. Se somarmos os lucros líquidos da EDP nos últimos 5 anos e 9 meses, eles totalizam já 5.399,1 milhões de euros a preços correntes (a preços actuais é um valor muito superior). Tudo isto mostra, por um lado, que o Estado perdeu uma fonte importante de receitas com a privatização da EDP; por outro lado, que a EDP privatizada se transformou num instrumento importante de exploração dos consumidores e de acumulação de elevados lucros para o capital privado que já a domina; e, finalmente, a EDP devido aos elevadíssimos lucros que já tem, pode absorver, sem grandes dificuldades, o chamado défice tarifário que está a ser utilizado para "justificar" o aumento do preço que se pretende impor à população. E isto continuando a obter lucros e sem aumentar os preços. Só teria de reduzir um pouco os elevadíssimos lucros que vem arrecadando, o que seria justificável face às dificuldades graves das famílias. Mas será isso que vai suceder? A resposta só poderá ser dada pelo governo, opondo-se ou vergando-se às exigências da EDP e de outras empresas, feitas através da ERSE, que se encontra totalmente refém da EDP».

E para percebermos a marosca toda:

«Para ficar claro os interesses que a ERSE está a defender, interessa referir que no fim de 2008, segundo o Relatório e Contas da EDP (pág.156), 49% do capital desta empresa estratégica já estava nas mãos de accionistas no estrangeiro (Espanha: 15%; Inglaterra:13%; Resto da Europa: 12%; EUA 9%). E, internamente, alguns dos principais accionistas são grandes grupos económicos (BCP com 3,39% do capital; BES: 3,05%; José de Mello com 4,82%). E segundo o art. 67º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, que o governo de Sócrates se tem recusado continuamente a alterar, 50% dos dividendos distribuídos aos seus accionistas por empresas que foram privatizadas (e a EDP é uma delas) estão isentos do pagamento de IRS e de IRC, enquanto os rendimentos do trabalho estão sujeitos a impostos elevados. Os comentários parecem ser desnecessários».

Isto é: a privatização de EDP (e note-se que todas as privatizações são o bolo e a cereja oferecidos pelo poder político aos senhores capitalistas, e uma das imagens de marca indissociáveis das políticas de direita) teve três resultados imediatos – e verdadeiramente dramáticos para a nossa economia e, consequentemente, para a população portuguesa no seu conjunto:

Não contente com isto, Sócrates e o PS ainda mantêm isentos de IRC e IRS 50% dos lucros arrecadas por estes accionistas todos. Mas você e eu, que trabalhamos – ou trabalhámos – no duro, pagamos com língua de palmo sobre tudo aquilo que ganhamos, sejam os nossos miseráveis ordenados, sejam as nossas míseras reformas. Nós não temos estas generosas isenções. No fundo, o assalto resume-se assim: os lucros deles são conseguidos à custa do que nos tiram dos bolsos e, na volta, só pagam impostos sobre metade do que ganharam. Lindo! Maravilhoso «socialismo»!

Depois disto, ainda andará por aí alguém a dizer que o senhor «engenheiro» e o PS são de esquerda? Só se forem – para disfarçar – os Espírito Santo e os Mellos.

Resumindo. Se a EDP fosse uma empresa nacionalizada, teríamos a electricidade muito mais barata e, ainda por cima, os seus lucros – que, mesmo assim, seriam opulentos – serviriam para melhorar, por exemplo, os orçamentos da Saúde e da Educação.

Mas isso seria com políticas de esquerda. Com políticas de direita, é o que se vê. O assalto permanente aos nossos bolsos.

(João Carlos Pereira)


Crónica lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 06/01/2010.
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