Quem divulgou as escutas feitas ao senhor Pinto da Costa no âmbito do processo Apito Dourado, prestou ao país um serviço inestimável: o de demonstrar, sem margens para mais dúvidas ou discussões, que, em Portugal, a administração da justiça não é uma coisa fiável, seja por culpa de alguns dos seus principais agentes, seja por culpa de uma legislação feita à medida de certos interesses de casta, que preferem salvaguardar as próprias barbas a permitir que a lei, a ordem e a decência sejam as margens sagradas da nossa convivência colectiva. Seja pelas duas coisas juntas.
Quem se deu ao cuidado de, como eu, ouvir todas aquelas gravações, se for pessoa séria e minimamente lúcida, sem dúvida que concluirá que, para o senhor Pinto da Costa e outras figurinhas, figuras e figurões da arbitragem e do mundo do futebol terem sido absolvidos dos crimes de que estavam indiciados, é porque esta coisa a que chamamos país não só bateu no fundo, como se desfez num monte dos mais indizíveis detritos.
Oscilo entre o espanto, a indignação, a revolta, o merecido escárnio e uma angustiante dúvida sobre o que, enquanto povo, ainda nos reservará o futuro, caso se mantenha o ambiente social e político que sustentou, absolveu e tentou abafar este escabroso processo. E pergunto-me, por isso, quem se terá sentido mais incomodado com a divulgação das escutas. Pinto da Costa? Certamente que não, pois está provado que os seus padrões morais não lhe permitem ter complexos de qualquer natureza. É o que se diz um descarado compulsivo, alguém para quem a vergonha e o bom-senso são coisas absolutamente desconhecidas. Vai continuar a destilar a sua ironia rançosa, a percorrer a sua senda de conspirações e vilezas, a promover ódios incendiários e, no fundo, a alimentar-se dessa amálgama de sordidez e perversão. É esta a sua natureza, dela não pode sair.
Mas se Pinto da Costa não perde o sono com estes sucedimentos, já muitos responsáveis judiciários e políticos, que têm mais massa encefálica que o dirigente tripeiro – ou, pelo menos, têm-na em melhor estado – perceberam que a divulgação das escutas representa um duro golpe para a sua credibilidade e para o seu estatuto. Perceberam que, a partir de agora, é justo concluir que se as coisas são assim com a corrupção no futebol, então é porque são assim – ou pior – em todos os outros casos sabidos ou a saber, incluindo, principalmente, os pesadíssimos processos que envolvem gente graúda do nosso país. Já se sabia – e agora provou-se – que há gente intocável, e que o poder legislativo e certos sectores da justiça – do arremedo dela – sabem como se fazem as coisas para proteger quem deve ser protegido.
Já não se trata de um caso absurdo, relacionado com o mundo do pontapé na bola, que, apesar de movimentar milhões, não deixa de ser uma actividade lateral do nosso quotidiano. Trata-se de ver provado – e à prova de bala – que tudo se trafica neste país, e o que aconteceu ao Apito Dourado, aconteceu – ou vai acontecer – em muitos outros processos, da Casa Pia ao Freeport, dos sobreiros da Portucale ao Face Oculta, da Operação Furacão aos escândalos com facturas falsas que, apesar de envolverem grandes empresas e terem lesado o estado em muitos milhões, não levaram ninguém à prisão.
Estupefactos, ouvimos figuras gradas da nossa sociedade erguerem a voz contra esse crime hediondo de se divulgarem gravações de forma ilegal, quando não ergueram a voz por verem ficar impunes aqueles que, indubitavelmente, corromperam ou foram corrompidos, adulterando, durante anos, resultados desportivos, e lucrando com essa adulteração de forma tão substantiva e continuada, que a prática de mover influências para alcançar objectivos desportivos, de tanto contumaz e persistente, já se transformara num modo de vida, numa coisa absolutamente normal, um atributo de quem sabe desenrascar-se na vida. Ou seja: a sordidez no seu máximo esplendor.
É claro para a opinião pública, das suas franjas mais esclarecidas até às menos iluminadas – e ninguém em seu perfeito juízo pode negá-lo, seja juiz, advogado, político, jornalista ou comentador encartado – que Pinto da Costa foi o núcleo de um antro corruptor, destinado a garantir sucessos desportivos ao clube que dirige e, por arrastamento, a outros clubes dirigidos por gente das suas relações, ou a quem prestava – ou de quem recebia – favores. É também claro que o poder político, cuja mão pesa sobre todo o aparelho do estado, incluindo outros órgãos de soberania, como o poder judicial, não se podia dar ao luxo de permitir desagradar a quem sempre soube lambuzá-lo, tanto mais que daí adviriam sérias consequência eleitorais, como muito menos interessava abrir precedentes que pudessem virar-se, mais dia, menos dia, contra ele próprio. Se juntarmos a isto solidariedades partidárias e clubistas, facilmente perceberemos toda a trama, sem esquecer o oportuno aviso a Pinto da Costa da sua eminente detenção, o que lhe permitiu fugir para a Galiza no dia em que a polícia se preparava para o deter.
Pinto da Costa é, feitas as contas, uma figura menor, um simples peão, no xadrez da nacional-vigarice. Mas é intocável porque, no dia em que um peãozinho destes cair, caem torres, cavalos, bispos, rainhas e reis.
Perceberam?
Quem se deu ao cuidado de, como eu, ouvir todas aquelas gravações, se for pessoa séria e minimamente lúcida, sem dúvida que concluirá que, para o senhor Pinto da Costa e outras figurinhas, figuras e figurões da arbitragem e do mundo do futebol terem sido absolvidos dos crimes de que estavam indiciados, é porque esta coisa a que chamamos país não só bateu no fundo, como se desfez num monte dos mais indizíveis detritos.
Oscilo entre o espanto, a indignação, a revolta, o merecido escárnio e uma angustiante dúvida sobre o que, enquanto povo, ainda nos reservará o futuro, caso se mantenha o ambiente social e político que sustentou, absolveu e tentou abafar este escabroso processo. E pergunto-me, por isso, quem se terá sentido mais incomodado com a divulgação das escutas. Pinto da Costa? Certamente que não, pois está provado que os seus padrões morais não lhe permitem ter complexos de qualquer natureza. É o que se diz um descarado compulsivo, alguém para quem a vergonha e o bom-senso são coisas absolutamente desconhecidas. Vai continuar a destilar a sua ironia rançosa, a percorrer a sua senda de conspirações e vilezas, a promover ódios incendiários e, no fundo, a alimentar-se dessa amálgama de sordidez e perversão. É esta a sua natureza, dela não pode sair.
Mas se Pinto da Costa não perde o sono com estes sucedimentos, já muitos responsáveis judiciários e políticos, que têm mais massa encefálica que o dirigente tripeiro – ou, pelo menos, têm-na em melhor estado – perceberam que a divulgação das escutas representa um duro golpe para a sua credibilidade e para o seu estatuto. Perceberam que, a partir de agora, é justo concluir que se as coisas são assim com a corrupção no futebol, então é porque são assim – ou pior – em todos os outros casos sabidos ou a saber, incluindo, principalmente, os pesadíssimos processos que envolvem gente graúda do nosso país. Já se sabia – e agora provou-se – que há gente intocável, e que o poder legislativo e certos sectores da justiça – do arremedo dela – sabem como se fazem as coisas para proteger quem deve ser protegido.
Já não se trata de um caso absurdo, relacionado com o mundo do pontapé na bola, que, apesar de movimentar milhões, não deixa de ser uma actividade lateral do nosso quotidiano. Trata-se de ver provado – e à prova de bala – que tudo se trafica neste país, e o que aconteceu ao Apito Dourado, aconteceu – ou vai acontecer – em muitos outros processos, da Casa Pia ao Freeport, dos sobreiros da Portucale ao Face Oculta, da Operação Furacão aos escândalos com facturas falsas que, apesar de envolverem grandes empresas e terem lesado o estado em muitos milhões, não levaram ninguém à prisão.
Estupefactos, ouvimos figuras gradas da nossa sociedade erguerem a voz contra esse crime hediondo de se divulgarem gravações de forma ilegal, quando não ergueram a voz por verem ficar impunes aqueles que, indubitavelmente, corromperam ou foram corrompidos, adulterando, durante anos, resultados desportivos, e lucrando com essa adulteração de forma tão substantiva e continuada, que a prática de mover influências para alcançar objectivos desportivos, de tanto contumaz e persistente, já se transformara num modo de vida, numa coisa absolutamente normal, um atributo de quem sabe desenrascar-se na vida. Ou seja: a sordidez no seu máximo esplendor.
É claro para a opinião pública, das suas franjas mais esclarecidas até às menos iluminadas – e ninguém em seu perfeito juízo pode negá-lo, seja juiz, advogado, político, jornalista ou comentador encartado – que Pinto da Costa foi o núcleo de um antro corruptor, destinado a garantir sucessos desportivos ao clube que dirige e, por arrastamento, a outros clubes dirigidos por gente das suas relações, ou a quem prestava – ou de quem recebia – favores. É também claro que o poder político, cuja mão pesa sobre todo o aparelho do estado, incluindo outros órgãos de soberania, como o poder judicial, não se podia dar ao luxo de permitir desagradar a quem sempre soube lambuzá-lo, tanto mais que daí adviriam sérias consequência eleitorais, como muito menos interessava abrir precedentes que pudessem virar-se, mais dia, menos dia, contra ele próprio. Se juntarmos a isto solidariedades partidárias e clubistas, facilmente perceberemos toda a trama, sem esquecer o oportuno aviso a Pinto da Costa da sua eminente detenção, o que lhe permitiu fugir para a Galiza no dia em que a polícia se preparava para o deter.
Pinto da Costa é, feitas as contas, uma figura menor, um simples peão, no xadrez da nacional-vigarice. Mas é intocável porque, no dia em que um peãozinho destes cair, caem torres, cavalos, bispos, rainhas e reis.
Perceberam?
(João Carlos Pereira)
Crónica lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 27/01/2010.
Não deixe de ouvir em 98.7 Mhz e participar pelos telefones 212277046 ou 212277047 todas as quartas-feiras entre as 09H00 e as 10H00.
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6 comentários:
Para quem ainda não teve oportunidade de ouvir, aqui vão os endereços:
http://www.youtube.com/watch?v=xK6nCGYB8Yw
http://www.youtube.com/watch?v=G5EMtn0EAYc
http://www.youtube.com/watch?v=dCvn2tEEj3E
http://www.youtube.com/watch?v=qgwoQoNmT6U
http://www.youtube.com/watch?v=P2dX61WvLDE
http://www.youtube.com/watch?v=CZAd9kYN5Z0
http://www.youtube.com/watch?v=wq87BdP3AaM
http://www.youtube.com/watch?v=WL8BCAUspp0
Sobretudo como cidadão livre, mas também, porque não assumir, como benfiquista, quero felicita-lo por este magnifico texto, pleno de lucidez, desassombro e oportunidade.
Um abraço
Pois é,meu Amigo! A grande verdade é
essa mesma: «Mas é intocável porque, no dia em que um peãozinho destes cair, caem torres, cavalos, bispos, rainhas e reis».
Anónimo que ñ o é...
i.c.
E que palavra terá o Sindicato dos Jornalistas sobre a violação do código deontológico por parte do senhor Teles?
Quem se presta a estes serviços não é merecedor de possuir uma carteira profissional.
Infelizmente ele não é o único a inventar notícias, mas, como foi apanhado, deve ter a punição merecida.
E enquanto uns «absolverem» - e, até, aplaudirem - os corruptos e os ladrões que por aí se espojam, só porque são do seu clube, ou do seu partido, ou porque, afinal, bem gostariam de ter a oportunidade de fazer o que eles fazem, este país será sempre um reles acampamento.
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