quarta-feira, 9 de junho de 2010

COISAS SÉRIAS E UMA ANEDOTA

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Falemos hoje da receita de Lula da Silva, que salvou o Brasil dos efeitos da crise económica e – mais do que isso – fez o país crescer enquanto os outros definhavam. Falando dessa receita, Lula da Silva até enviou um recado a Durão Barroso, dizendo que se ela fosse aplicada na Europa não estaríamos nós, os europeus, a sofrer o que hoje sofremos. Disse Lula que o que se fez no Brasil foi combater a pobreza, aumentando o poder de compra das classes mais desfavorecidas, invertendo a tendência que se regista nos países do capitalismo puro e duro (como por cá), onde há cada vez mais gente pobre – e a pobreza dos pobres é cada vez maior.

No Brasil, fruto dessa receita, a economia cresceu com o aumento da procura, a produtividade aumentou, a confiança foi-se instalando e, de uma maneira geral, os brasileiros começaram a perceber que vale a pena o esforço quando o sentido da governação aponta para uma sociedade que quer distribuir a riqueza criada de forma menos injusta e desequilibrada. É verdade que o Brasil está longe de ser um modelo de virtudes económicas, políticas e sociais, mas também é verdade que Portugal estaria muito melhor se fosse governado como, nos últimos anos, o Brasil o tem sido. E que a sorte que o Brasil tem é não lhe ter saído nenhum Sócrates e nenhum PS na rifa. Estaria, como nós estamos, completamente atolado.

«… quando Guterres chegou ao Governo, a dívida
rondava os 10% do PIB e, 15 anos depois, com todas
as trafulhices e embrulhadas que sabemos (fora as que
ainda não sabemos) já se deve 120% do PIB. Esta é,
sem espaço para desmentidos, a grande obra
do PS e do PSD»
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Dito isto, pus-me a pensar se haveria mais alguma coisa para dizer sobre a receita brasileira. Concluí que não. E concluí, para minha surpresa – e com alguma satisfação – que não tenho feito outra coisa, ao longo dos últimos anos, que não seja reclamar, para o meu país, uma política diferente, que, tal como Lula recomenda, ponha a economia ao serviço das pessoas, e não as pessoas ao serviço da economia. Mas isso, digam o que disserem, não será possível com gente como a que nos tem governado, que está ao serviço do capital financeiro – ou dele se deixou fazer refém. E se alguém tem dúvida que as receitas de recuperação económica não passam de meros instrumentos para impor sacrifícios aos que trabalham e produzem, afinal, tudo o que se consome e exporta, basta lembrar que quando Guterres chegou ao Governo, a dívida rondava os 10% do PIB e, 15 anos depois, com todas as trafulhices e embrulhadas que sabemos (fora as que ainda não sabemos) já se deve 120% do PIB. Esta é, sem espaço para desmentidos, a grande obra do PS e do PSD.

Em Portugal, Sócrates e o PS – e, pelos vistos, Passos Coelho e o PSD – dizem que é castigando os salários, aumentando os impostos, mesmo sobre os bens de primeira necessidade, oferecendo o que resta do aparelho produtivo e das empresas estratégicas às mãos gulosas dos interesses privados, ou fechando escolas, urgências hospitalares e centros de saúde que a crise se resolve. Eles sabem, porque burros não são, que foram essas medidas políticas que conduziram, precisamente, ao estado a que a economia chegou, ao alastrar da miséria que por aí vemos, enquanto, no topo da pirâmide social, as fortunas se acumulam de forma nunca vista.

Não acredito que Sócrates e Passos Coelho ignorem que das medidas que impõem só possam resultar mais estagnação económica, maior asfixia do mercado interno, menos actividade produtiva e mais falências. Eles sabem que Lula tem razão, pois PS e PSD estão fartinhos de saber, para lá do discurso aldrabão sobre o «interesse nacional», que estas medidas só convêm aos interesses do grande capital e dos mercados especulativos que, sob o ponto de vista ideológico defendem e, objectivamente, pelas práticas políticas, representam. Eles sabem que a receita de Lula seria melhor para o povo e o país, mas seria pior para o grande capital e para os sectores especulativos da economia que lhe estão associados. No fundo, não passam de miseráveis vende pátrias.

Entretanto, e para a malta se divertir, Sócrates vai inventando medidas políticas autenticamente anedóticas. Desta vez, quer pôr os cábulas do 8.º ano a puderem aceder ao 10.º sem terem de frequentar o 9.º, coisa que, incrivelmente, está vedada aos bons alunos. No fundo, a governo pensa que um cábula de 15 anos, que não dá uma para a caixa, de repente se mete em brios e passa a saber, sem ir às aulas, aquilo que os outros, os bons alunos, são obrigados a gastar um ano para aprender. Estranho que a distinta ministra da Educação, doutora Alçada (que é mesmo doutora a sério) defenda a coisa, que me parece um verdadeiro aborto educativo. Afinal, senhora ministra, para que servem as aulas, a assiduidade, a avaliação contínua e periódica? No fundo, para que servirá o 9.º ano? Ou outro qualquer?

Ou será que se prepara, em nome da redução do défice, algo de verdadeiramente revolucionário? O quê? Fechar as escolas todas, dispensar a maioria dos professores, e pôr a malta a enviar os seus exames por fax.

Perfeitamente normal. Não foi assim que o outro conseguiu ser engenheiro?


(João Carlos Pereira)


Crónica lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 09/06/2010.
Não deixe de ouvir em 98.7 Mhz e participar pelos telefones 212277046 ou 212277047 todas as quartas-feiras entre as 09H00 e as 10H00.

2 comentários:

CV disse...

Ouvi com toda a atenção o debate que se travou na Rádio Baía entre o João Carlos Pereira e um senhor que diz chamar-se Gonçalo, ficando a saber que a culpa do estado a que isto chegou não é de quem nos tem (des)governado, mas sim de uma tal senhora de nome Conjuntura. Gostava de a conhecer para lhe dizer das boas e perguntar-lhe se não tem vergonha do que anda a fazer.

Anónimo disse...

Segundo fontes geralmente bem informadas, soube-se que a Conjuntura e irmã gémea da Crise, filhas do senhor Capital Financeiro e da D. Especulação. Vivem no Palácio da Bolsa, sito na Alameda da Economia de Mercado.

João Carlos Pereira