quarta-feira, 16 de junho de 2010

A FAMÍLIA

...
Há quem diga, com o ar mais sério deste mundo, que a crise não tem culpados. Que não tem autores. Que é uma coisa que acontece, assim como um sismo… e pronto. Se apertarmos com eles, dizendo que os culpados da crise só podem ser aqueles que têm nas mãos os cordéis da economia e, por isso, cozinham e impõem as políticas económicas, recusam a acusação e, sem saída, balbuciam que a culpa da crise é – vejam lá bem – da conjuntura. O que é isso da conjuntura, como apareceu – porquê e para quê – aí falta-lhes a resposta. Gaguejam, metem os pés pelas mãos e não saem dali. Como só podem estar a reinar com a malta – ou a tomá-la por estúpida – deixem-me também reinar um pouco. Ou não…

Então, lá vai: a Conjuntura é irmã gémea da Crise, e são filhas do senhor Capital Financeiro e da D. Exploração Desenfreada. Vivem no solar da Pura Especulação e têm escritório aberto no Palácio da Bolsa, sito na Alameda da Economia de Mercado. O planeta Terra, na sua quase totalidade, é uma coutada desta distinta família, que tem a seu mando, para gerir tão imenso património, um vasto séquito de serviçais, constituídos por vários presidentes da república, primeiros-ministros, ministros, secretários de estado e senhores deputados – a classe política, enfim – recrutados nos vários centros de emprego da social-democracia mais ou menos liberal, centros estes vulgarmente designados por partidos políticos.

Esta ilustre família (ou, simplesmente, a Família) – cujos interesses, em Portugal, são defendidos, neste momento, pelo Partido Socialista, do notável engenheiro José Sócrates, coadjuvado pelo PSD, do novel doutor Passos Coelho – considerou que era chegado o momento de sangrar um pouco mais o rebanho humano de que se nutre. Mais impostos, menos poder de compra, mais trabalho, menos Saúde, mais desemprego, menos Educação. Mais fome, menos – e pior – vida. Atentos e obsequiosos, os carrascos de serviço não se fizeram rogados, que é para isso mesmo que eles cá estão. Alforge na mão esquerda, garrote na mão direita, o beleguim Teixeira dos Santos lançou-se ao trabalho, tributando a torto e a direito, e ameaçando ir mais longe na sua fúria predatória, caso a Família assim o exija. E, claro, os fustigados se encolham, em vez de espernear.

Vem de longe – de muito longe, mesmo – este gosto da Família em viver sem trabalhar, já que nunca se lhe viu gesto ou traje que do labor tivesse o cheiro. Sabe-se que, outrora, encheu baús de ouro mercadejando escravos ou exaurindo servos da gleba, para depois, já em tempos mais chegados, forçar multidões de camponeses e operários a mourejar de sol a sol, isto sem esquecer que, sempre que tal lhe conveio, de toda esta turba fez soldados, os enfileirou em exércitos para, entre hinos e bandeiras, os lançar no caldeirão da guerra, como verdadeira carne para canhão.

Diz-se, aliás, que é em tempo de guerra que a Família mais aumenta o seu pecúlio, e nisso não é difícil crer, se atentarmos no que sucedeu na Alemanha nazi, onde todos os grandes grupos económicos sobreviveram à guerra sem um arranhão, florescendo entre as ruínas de um país destruído e ceifado de milhões de vidas. Atente-se, também no que aconteceu recentemente no Iraque, onde a Família engordou com o saque e, na mesma remada, a reconstruir o que tinha acabado de mandar destruir.

Mudando de tom: como as coisas estão montadas, a nossa vida será sempre uma sequência de crises, guerras, devastação, saque, recuperação, e outra vez a crise. Enfim, um eterno baralhar e dar de novo. No fim de cada crise, de cada guerra – de cada jogada – os donos do capital financeiro estarão mais ricos e as classes trabalhadoras – os que tudo produzem, afinal – estarão mais pobres. Neste complexo sistema controlado por funâmbulos e ilusionistas, artistas bem pagos de uma comunicação social especializada em lavar o cérebro ao rebanho, apenas uma coisa se torna claramente óbvia: só quando aqueles que produzem toda a riqueza tiverem nas mãos a capacidade de reparti-la, o mundo será mais justo e, naturalmente, as crises serão coisas do passado. Só quando o sistema financeiro for controlado por um poder político que esteja ao serviço das forças produtivas – e só nessa altura – é que viveremos numa sociedade realmente justa e equilibrada.

Foi certamente a pensar nisto que o Partido Comunista Grego colocou uma enorme faixa na Acrópole, dizendo:

POVOS DA EUROPA: UNI-VOS!


(João Carlos Pereira)

Crónica lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 16/06/2010.
Não deixe de ouvir em 98.7 Mhz e participar pelos telefones 212277046 ou 212277047 todas as quartas-feiras entre as 09H00 e as 10H00.

5 comentários:

Anónimo disse...

Ouvi com toda a atenção o debate que se travou na Rádio Baía entre o João Carlos Pereira e um senhor que diz chamar-se Gonçalo, ficando a saber que a culpa do estado a que isto chegou não é de quem nos tem (des)governado, mas sim de uma tal senhora de nome Conjuntura. Gostava de a conhecer para lhe dizer das boas e perguntar-lhe se não tem vergonha do que anda a fazer.

Anónimo disse...

Eu não pediria tanto. Já me contentava que os portugueses se unissem para acabar com a cambada que pertence a esta família.
E se colocássemos também uma faixa na Torre de Belém ou nos Jerónimos?

Anónimo disse...

Melhor! Pendurada entre o Cristo-Rei e o Castelo de S. Jorge.

João Carlos Pereira

Anónimo disse...

Mas ele há tantas familias, tantas, algumas já com mais de trinta anos de existencia...

Anónimo disse...

A Conjuntura, familia da qual se pode extrair o radical, transformando-a numa outra doença, Conjuntivite, que aliada ao estrabismos e astigmatismo que vem afectando os portugueses desde 25 de Novembro de 1975, tem feito com nas sucessivas eleições a que têm sido chamado , no acto de colocarem a cruzinha no boletim de voto, o façam sempre no quadrado errado.
É bom que o povo entenda que não são os comunistas que comem as criancinhas, quem faz isso são os representantes da Igreja, e esses de certeza que votam nos partidos que subsidiam a Conjuntura e a sua amiga Crise, pois só assim eles podem subsistir neste mundo onde o desemprego, os pobres e a fome estão em enormissima maioria.
Eu deixava aqui uma palavra de ordem para ser ouvida por todo o mundo:
"Desempregados, expoliados e famintos de todo o mundo UNI-VOS".

Ah, e ao Sr. Gonçalo, dava-lhe umas senhas para ele ir comer durante uns meses largos, onde vão comer muitos dos que sofrem os efeitos dos maleficios da Conjuntura e da sua amiga Crise, para ver se ele, depois desses meses falava da mesma maneira.

Abaixo a Conjuntura e a Crise.