Um ilustre ex-ministro socialista decretou, aqui há uns tempos, que a Margem Sul era um deserto. Durante muito tempo, a afirmação deu pano para mangas, desde origem a várias anedotas, até à passagem de atestado de atrasado mental ao seu autor. Infelizmente, devo dar a mão à palmatória e – mais do que isso – ir um pouco mais longe: isto é um deserto e todos nós – os que aqui vivemos (perdão: sobrevivemos, ou vegetamos) – não passamos de uns autênticos e desprezíveis camelos. Apresso-me a explicar.
Como sabemos, andam muito agitadas as populações de várias regiões do país, ameaçadas com a possível introdução de portagens em algumas estradas. E fazem bem em contestar tal alarvidade, porque a medida não passa de uma cega carga tributária destinada a pagar os estragos de consecutivas más governações. O governo quer dinheiro, e toca de o ir buscar àqueles que pagam sempre a factura. A bem, ou a mal. Um dia virá em que se criará um imposto de circulação para quem anda a pé, sob o inestimável e lúcido pretexto de que é necessário manter em bom estado as pedrinhas da calçada. Já faltou mais… Mas vamos ao que interessa.
Em Novembro de 2002, era eu director do jornal Outra Banda, escrevi o seguinte, no âmbito de uma campanha pela abolição de portagens na Ponte 25 de Abril: «Milhares de pessoas residentes na Margem Sul são coagidas ao pagamento diário de uma portagem para atravessarem a Ponte 25 de Abril. Rotulamos essa portagem de absurda, porque a Ponte está paga desde há muito, representando hoje um apetecido mealheiro para os interesses de empresas privadas; absurda, porque não há registo que se pague idêntica portagem em qualquer outra ponte de Norte a Sul do País, nem mesmo nas que ligam Portugal a Espanha; absurda e injusta, porque a Ponte 25 de Abril é uma via rodoviária que não tem alternativas a quem vive nos concelhos da Margem Sul e tem em Lisboa (ou para Norte) o seu ganha-pão, local de estudo ou à capital precisa de se deslocar para, por exemplo aceder a serviços médicos. Na Idade Média, às portas dos burgos, as autoridades feudais cobravam impostos a quem entrava para comerciar os produtos agrícolas ou vender a sua força de trabalho. Séculos volvidos, observamos com espanto, através das portagens da Ponte 25 de Abril, que quem trabalha, quem estuda ou quem se vê obrigado a deslocar-se a Lisboa para tratar dos seus assuntos, está sujeito, como mais ninguém neste país está, a pagar a mesma dízima». E resumia estas questões no seguinte quadro:
Como sabemos, andam muito agitadas as populações de várias regiões do país, ameaçadas com a possível introdução de portagens em algumas estradas. E fazem bem em contestar tal alarvidade, porque a medida não passa de uma cega carga tributária destinada a pagar os estragos de consecutivas más governações. O governo quer dinheiro, e toca de o ir buscar àqueles que pagam sempre a factura. A bem, ou a mal. Um dia virá em que se criará um imposto de circulação para quem anda a pé, sob o inestimável e lúcido pretexto de que é necessário manter em bom estado as pedrinhas da calçada. Já faltou mais… Mas vamos ao que interessa.
Em Novembro de 2002, era eu director do jornal Outra Banda, escrevi o seguinte, no âmbito de uma campanha pela abolição de portagens na Ponte 25 de Abril: «Milhares de pessoas residentes na Margem Sul são coagidas ao pagamento diário de uma portagem para atravessarem a Ponte 25 de Abril. Rotulamos essa portagem de absurda, porque a Ponte está paga desde há muito, representando hoje um apetecido mealheiro para os interesses de empresas privadas; absurda, porque não há registo que se pague idêntica portagem em qualquer outra ponte de Norte a Sul do País, nem mesmo nas que ligam Portugal a Espanha; absurda e injusta, porque a Ponte 25 de Abril é uma via rodoviária que não tem alternativas a quem vive nos concelhos da Margem Sul e tem em Lisboa (ou para Norte) o seu ganha-pão, local de estudo ou à capital precisa de se deslocar para, por exemplo aceder a serviços médicos. Na Idade Média, às portas dos burgos, as autoridades feudais cobravam impostos a quem entrava para comerciar os produtos agrícolas ou vender a sua força de trabalho. Séculos volvidos, observamos com espanto, através das portagens da Ponte 25 de Abril, que quem trabalha, quem estuda ou quem se vê obrigado a deslocar-se a Lisboa para tratar dos seus assuntos, está sujeito, como mais ninguém neste país está, a pagar a mesma dízima». E resumia estas questões no seguinte quadro:
PORQUE SERÁ QUE A MARGEM SUL PAGA PORTAGEM
PARA ENTRAR EM LISBOA?
- Porque é assim para as outras regiões que envolvem a capital do país? NÃO!
- Porque quem atravessa as pontes para entrar no Porto também paga? NÃO!
- Porque quem atravessa as pontes para entrar em Coimbra também paga? NÃO!
- Porque quem atravessa as pontes para entrar em Santarém também paga? NÃO!
- Porque quem passa a ponte do Guadiana, para Espanha, também paga? NÃO!
- Porque quem atravessa o túnel da Gardunha também paga? NÃO!
- Porque a Ponte 25 de Abril ainda não está paga? NÃO!
- Porque existem alternativas gratuitas? NÃO!
Se as populações que lutam contra as portagens nas SCUTS têm razão para a isso se opor, principalmente porque as vias alternativas de que dispõem, pela sua má qualidade, não o são de facto, mais razões tem quem vive na Margem Sul, pois não dispõe, realmente, de nenhuma alternativa. Nem boa, nem má. Aqui, ou pagamos… ou pagamos.
Em Janeiro de 2003, ainda no jornal Outra Banda, voltava ao tema: «Sabemos que as portagens da Ponte 25 de Abril são uma matéria que escalda. Caiu-se tão fundo na ilegalidade, no oportunismo, na cobardia, na inacção, deixou-se que tudo apodrecesse tanto, que, hoje em dia, tentar emendar a mão que errou, por acção ou omissão, tornou-se num martírio para o carácter calculista dos actuais políticos».
Mantém-se actual tudo o que então escrevi. E recordo que Salazar, o ditador fascista, prometeu, em nome do governo de então, que a Ponte deixaria de ter portagens, mal estivesse paga. Há muito que o está. Os democratas de hoje olham para a Margem Sul como se olha para um gueto, onde residem cidadãos de segunda que não têm, como os restantes cidadãos deste país, o direito a circular, gratuitamente, pelo território nacional. Nem para entrar na capital do feudo.
Está bem. Como isto é um deserto, nós somos os respectivos camelos. E, como tal, não podemos ser tratados como gente. Era só o que faltava!
(João Carlos Pereira)
Crónica lida nas "Provocações" da Rádio Baía em 07/07/2010.
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