Acabou o longo prólogo do processo Casa Pia. Vamos entrar, agora, certamente que por muitos e largos anos, no romance propriamente dito. E, a julgar pelo que já vimos e ouvimos, a coisa promete. Para já, e de tudo o que se passou durante estes últimos oito anos, ficaram algumas certezas.
- A primeira, é que existiam na nossa sociedade – e, seguramente, continuam a existir – muitos cavalheiros cuja área libidinosa lhes dá para se satisfazerem através de relações sexuais com crianças e jovens, preferencialmente do mesmo sexo. Para além de homossexuais – coisa que não pensam ser – são pedófilos.
- A segunda, é que a Casa Pia era, através de um seu empregado – e antigo aluno – a fornecedora de corpos jovens e baratos.
- A terceira, é que um diversificado grupo de indivíduos, bem instalados na sociedade, se dedicou, ao longo de muitos anos, a práticas sexuais com dezenas – eventualmente, centenas – desses jovens, a quem pagavam para o efeito.
- A quarta, é que tal perversidade era assumida como uma coisa banal, um prazer que o dinheiro comprava, como comprava qualquer outro luxo. Extravagâncias de Césares dos nossos tempos.
- A quinta, é que alguns desses sujeitos foram chamados a prestar contas à justiça.
- A sexta, é que outros desses indivíduos – uns por razões sabidas, outros, por razões ainda por saber – se livraram do banco dos réus. (É um dos agora condenados – Carlos Cruz – que confirma isso mesmo, algo, aliás, que o país há muito já percebera).
- E, finalmente, a sétima: vão seguir-se, a par dos expedientes legais tendentes a revogar as condenações agora aplicadas, os expedientes da mais variada ordem, levando a que a necessidade de proteger os pedófilos que agora conseguiram escapar às malhas da lei, venha a provocar que tudo dê em águas de bacalhau. Carlos Cruz já teve o cuidado de enviar, publicamente, os recados necessários às orelhas convenientes, ao perguntar com todas as letras: Então, e os outros? O que soou assim: ou me livram desta, ou abro o bico.
Para além destas certezas, uma esperança: que a Justiça consiga, através deste tremendo processo, provar aos portugueses que existe para garantir o primado da lei sobre a arbitrariedade, a violência e a devassidão, que não há uma Justiça para os pobres e outra para os ricos – ou para os que têm as costas quentes por qualquer partido – enfim, que não está refém do poder político e que não se deixa intimidar nem corromper.
Que nos dê, em suma, um motivo para acreditar que nem tudo está perdido. Que puna exemplarmente os pedófilos apanhados, e que apanhe os que andam por aí ainda à solta.
Os tais outros, para citar Carlos Cruz.
(João Carlos Pereira)
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Crónica lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 08/09/2010.
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4 comentários:
Com o devido respeito pelas opiniões de cada um, parece-me no entanto algo precipitado condenar na praça pública os que agora foram julgados, já que todo o processo está inquinado desde o princípio e sinceramente, parece-me que estes apenas serviram de bodes expiatórios e que os tais “outros” se têm safado muito bem até aqui.
Por isso não se percebe o ódio de estimação do PCP, que até levou Jerónimo de Sousa no seu discurso de encerramento da Festa do Avante a congratular-se com a decisão do Tribunal, como se a Justiça deste país fosse apenas e só o caso Casa Pia. Mais valia ter ficado calado e não meter a foice em seara alheia, porque nunca se sabe o que reserva o futuro.
Isto até parece mais um processo de ricos contra pobres, ou vice-versa, como se os desvios sexuais fossem exclusivos de quem tem mais dinheiro.
Não conheço pessoalmente nenhum dos envolvidos no processo, mas pelo pouco que se sabe do mesmo, contém muitas inverdades e nenhuma prova minimamente credível de modo a convencer-nos que estes praticaram tais actos repugnantes.
Ao fazer-se uma leitura mais atenta dos fundamentos que levaram à condenação, certamente que ficará à mostra a vulnerabilidade da acusação, se esta não indicar exactamente os dias e as horas em que os arguidos cometeram os tais crimes e que provas concretas existem dos mesmos.
É que não basta repetir incessantemente uma mentira para que ela se torne verdade.
Meu caro José Augusto
Muitos anos antes do Processo Casa Pia ter rebentado, já eu sabia, através de uma pessoa das minhas relações que trabalhava na casa de um dos apresentadores do ZIP-ZIP, das porcaria em certos sujeitos estavam envolvidos. A coisa não era totalmente às claras, mas era feita à vontadinha. Os nomes que essa pessoa referia (um deles de alguém já falecido) correspondiam, entre outros, a quase todos que agora foram julgados. Para mim, também por isso, é fumo e fogo da mesma fogueira. Não perceber isto é, no mínimo, padecer de uma grande dose de ingenuidade.
O fenómeno, é verdade, atravessa a nossa sociedade, infectando todas as classes sociais, mas não há dúvida que os ricos, por terem dinheiro, podem ter carne fresca servida à lista. O Bibi, que não foi o único predador de crianças e jovens, era, também, o fornecedor - e disto penso que ninguém duvida.
Agora, o que mais me dói - e enraivece - e ter a certeza que há nomes que não foram divulgados e outros que, apesar de o serem, se livraram do banco dos réus. Porquê? Porque estão bem encostados politicamente. E fosse o PS um partido sem expressão e sem o poder que tem a nível da manupilação dos diversos cordelinhos, e teríamos visto muitos mais nomes sonantes a pagar pelos seus crimes.
A vergonha continua.
Então onde está a tal fundamentação das sentenças?
Razão tinha o Sá Fernandes: se calhar ainda nem sequer estava escrita.
Está visto e provado. Pelo teor de certos comentários, o país está povoado, maioritariamente, por autênticos atrasados mentais.
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