O leitor sabe quanto é um milhão de euros? Faz uma ideia, claro.
Com ele, podia comprar uma excelente moradia, mobilá-la de alto a baixo,
escolher um automóvel de luxo e constituir uma conta bancária que lhe rendesse
cerca de mil euros líquidos por mês. Mas quando lhe perguntam quanto é mil
milhões de euros, já lhe é mais difícil quantificar esse valor, ou seja,
traduzi-lo em bens. Mas é simples: mil milhões de euros equivalem a mil belas
moradias mobiladas, como aquela que vimos – que imaginámos –, mais mil
automóveis de luxo, mais uma conta bancária que lhe rendesse mil vezes mais do
que aquela que abriria com o que sobrasse do tal milhão. Ou seja: que lhe
rendesse, não mil euros por mês, mas um interessante milhão de euros por mês.
Duzentos mil contos. Nada mau, não é verdade?
Agora, uma pergunta chata: sabe quanto estão a custar ao país
aquelas coisas chamadas Parcerias Público-Privadas? No mínimo, mil e trezentos
milhões de euros. Ou seja: mil milhões de euros mais trezentos milhões de
euros. A módica quantia de três milhões e meio de euros por dia – e sempre a
subir.
Agora que já está apto a pensar em milhões de euros – e não em
cêntimos, como faz no dia-a-dia – deixe-me perguntar-lhe se faz ideia de quanto
foi a burla do BPN? Não se lembra, ou nem sabe dizer? Pois aí vai: foi a maior
burla de sempre em Portugal, qualquer coisa como 9.710.539.940,09 euros. Nove
mil e oitocentos milhões de euros, em números redondos. Isto dava para sete mil
excelentes moradias mobiladas, mais sete mil automóveis de luxo, mais uma conta
bancária que lhe rendesse sete milhões de euros por mês, isto é, um milhão e
quatrocentos mil contos mensais.
Não lhe pergunto, caro leitor, se sabe quem está a pagar estes
milhões todos, pois não quero cometer a indelicadeza de o considerar um
atrasado mental, que anda por aí sem conseguir perceber como é que o sistema
funciona. Claro que é você, sou eu, somos todos nós, salvo dois tipos de
pessoas: as que subscreveram os contratos das PPP e os burlões do BPN.
Num e noutro caso, como sabe, estão altas figuras da finança e da
política. Os figurões do costume. Os intocáveis do costume. O julgamento do caso BPN já começou, é
verdade, mas a comunicação social pouco tem falado nisso, como convém. Há 15
arguidos, acusados dos crimes de burla qualificada, falsificação de documentos
e fraude fiscal, mas estão dispensados de comparecer no julgamento. Furte-se
uma lata de atum no supermercado e vai-se dali para o xilindró. Canalha da
alta, nem no banco dos réus se senta. Nas PPP é – imagine-se! – a Troika a
sugerir ao governo que desfaça o nó górdio, usando, se necessário a indignação
popular para o efeito. O quê?! Nada disso, à bruta só se trata o Zé.
Punhos-de-renda para quem se abotoa através de contratos leoninos.
Compreende-se: parceiros privados e decisores políticos, tanto no governo, como
no Parlamento, são unha com carne. São o toma-lá-dá-cá. E não te rales, que o
Povo é sereno. E a Justiça é mesmo cega, para além de surda, muda e
tetraplégica.
Entretanto, o défice sobe, a recessão aumenta, à austeridade querem
juntar mais austeridade, esse chicote que fustiga trabalhadores, pensionistas,
gente comum. Burlões intocáveis, gatunos, corruptos e corruptores, enfim,
criminosos de alto gabarito ligados ao Centrão, próceres que no PS e no PSD – à
vez ou em conluio – vão esvaindo o país, continuam a dividir o que resta pelos
verdadeiros donos disto tudo.
Mas não lhe chamam pilhagem. Chamam-lhe privatizações.
(João Carlos Pereira)
Crónica lida nas “Provocações” da Rádio
Baía em 04/07/2012.
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