quarta-feira, 16 de novembro de 2011

A BESTA

Há dias, uma eminência parda do governo do doutor Passos e do enfermeiro – ou carniceiro? – Gaspar, saiu-se com esta tirada bestial: «Os jovens portugueses desempregados devem emigrar, em vez de ficarem na sua “zona de conforto”». A besta (porque a sua tirada foi bestial) que urrou o dislate é o secretário de Estado da Juventude e do Desporto, Alexandre Miguel Mestre. A frase, só por si, diz tudo. Um dos responsáveis pela juventude portuguesa, cuja primeira obrigação seria a de criar condições para que todos os jovens deste país pudessem, na sua pátria, realizar-se como homens e cidadãos, e a ela dando, em contrapartida, o melhor das suas competências, sintetizou, em quinze palavras, o que pensa dos portugueses e do país. Podia ter dita apenas: Andas por aí aos caídos, não é? Olha, pá, desenrasca-te. Ou então: Quem está mal, muda-se. Ou para ser completamente franco: Pirem-se daqui para fora. Não me chateiem.

Este bestial governante até acha que os jovens devem sair da sua «zona de conforto». Presumo que queria dizer, lá na sua, que estar desempregado, viver às custas dos pais, mendigando uns trocos e vendo a vida a passar-lhe ao lado é como estar ainda no aconchego do útero materno. Coitada da besta que, por ter o azar de não estar desempregada, deve sentir-se extremamente desconfortável. Daí o coice. Arre macho, que estás com a mosca! Ou foi o cheiro da palha?

Emigrar é, então, a solução para os jovens desempregados. Cavem daqui para fora, que a enxovia já deu o que tinha a dar. Pisguem-se também os desempregados menos jovens, vejam se arranjam trabalho na Andaluzia a colher fruta, ou na construção civil na Holanda ou na Bélgica. Parece que os palheiros na Andaluzia e os dormitórios em barracões nos Países Baixos não andam muito longe dos bidonvilles. E até pode ser que vos paguem qualquer coisa no fim do mês. Raspem-se mas é todos os desempregados, mais os reformados que ainda possam trabalhar, deixem-se de andar por aí confortavelmente à míngua, não vêem como desembarcam em Itália, França ou Espanha, vindos de África, milhares de pessoas que, nos seus países, também estavam confortavelmente sem fazer nada, a coçar preguiçosamente os sovacos e outras zonas igualmente mal cheirosas?


Toca a emigrar, seu bando de inúteis, porque este país não está para jovens, como não está para velhos, nem para os que já não são jovens mas ainda não são velhos. O Sócrates não emigrou? O Guterres não emigrou? O Durão não emigrou? Só não emigram os que conseguem um lugarzinho na Mota-Engil, na Lusoponte, na Caixa Geral de Depósitos, no Millenium, na PT, na Galp e por aí fora.

Bem. Emigrar todos, também não. Fique pelo menos alguém que saiba como se faz papel higiénico.

É só para a besta não sujar os dedinhos.





(João Carlos Pereira)


Crónica lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 16/11/2011.

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