quarta-feira, 30 de novembro de 2011

A ENGORDA



Compra-se um porco, pouco mais que um leitão, e durante alguns meses trata-se o bicho com todo o carinho. Mal sabe o animal que o dono não o faz por amor, mas por interesse. Quando, lá para o inverno, o bácoro estiver anafado, leva com a faca no cachaço e paga, com juros, os meses da engorda. Esta é a engorda tradicional, cada vez mais em desuso.

Agora, quando se fala em engorda, é doutra coisa que se fala. Um tipo desde cedo se arrima a um partido com vocação para o poder, começa nas fileiras da Juventude das hostes, aprende as manhas e os tiques da política com o baronato do redil, é premiado com uns cargos que a sua dedicação justifica – dinheiro quanto baste, trabalho nenhum – e por aí se serve. Se tiver sorte e souber encontrar os arrimos certos, até pode chegar a primeiro-ministro.

Outros, vêm lá das berças com uma mãozita atrás e outra à frente, mas trazem uma cartinha de recomendação passada pelo senhor doutor advogado lá da terrinha, para um colega, também advogado, bem colocado em Lisboa, ligado a um certo partido político que está – ou já esteve – no governo. Se não se é parvo de todo e se mostrar que se é pau para toda a obra, trepa-se depressa. Arranja-se uma licenciatura, caso dela não se disponha – há universidades milagrosas, uma para cada um dos principais partidos – passa-se a ser o senhor doutor, ou engenheiro, e fica-se apto a mais largos voos. Num dia, é-se secretário de estado, no outro já se é ministro. Se os deuses ajudaram, até primeiro-ministro um tipo destes pode ser.


Como o tempo passa a correr, tão depressa se está no governo, como fora dele, pois a democracia tem uma coisa chamada eleições, algo necessário a que os verdadeiros democratas se alimentem alternadamente à mesa do orçamento. O problema, de facto, é o tamanho da mesa: é uma mesa pequena, não dá para todos ao mesmo tempo. Ora agora comes tu, ora agora como eu.

Esta é a primeira fase da engorda dos tempos modernos, que também se distingue da engorda tradicional porque não se mata o porco por altura do Natal. Realmente, findo este ciclópico período de engorda, um verdadeiro sacrifício em prol da nação, o ex-governante vai engordar para outra pocilga, isto é, vai ocupar um lugar de destaque numa das muitas empresas que, por mero acaso, teve a felicidade de, enquanto governante, ajudar a medrar. É a segunda e decisiva fase da engorda.

Este pequeno apontamento sobre pecuária, porcos e porcarias não ficaria completo sem uma última informação: Mota-Engil, Iberdrola, Lusoponte, PT, BPN, SLN, CGD, BCP e GALP são os locais de engorda preferidos das duas varas de porcos mais conhecidas do nosso país.

Moral da história: este país é um chiqueiro.




(João Carlos Pereira)



Crónica lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 30/11/2011.

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