quarta-feira, 2 de novembro de 2011

EU, VILÃO, ME CONFESSO

A propósito da terrível situação que vivemos, mantenho, com algumas pessoas uma acesa troca de opiniões. Verifico, sem espanto, porque já ando cá há alguns anos, que deixaram de achar corajosos, acutilantes, justos e oportunos os meus pontos de vista sobre a governação laranja, que só difere da governação rosa porque está a enterrar a faca muito mais fundo e com maiores requintes de malvadez.

De um gajo porreiro, passei a um ser tipo agressivo, descortês, insultuoso e provocador. Diga-se que a desculpa para a indignação não é tanto aquilo que digo, mas – alegam eles – a forma como o digo. Não tenho espaço, tempo ou pachorra para recuperar o muito que disse de Sócrates e do PS, bem como dos que, com o seu apoio, nos puseram, durante seis anos, nas mãos do «maior sacripanta» que alguma vez tinha governado o país.

De «bando cor-de-rosa» e de «malfeitores» (10.11.10), até chamar aos socialistas que apoiavam o governo um grupo de «velhacos ou imbecis» 13.10.11), ou «gente medíocre e desprezível, tartufos» (06.10.10), nada faltou no menu da minha indignação. E não me faltaram aplausos de vários quadrantes, a começar pelos que agora me estigmatizam. Até Sócrates ser corrido, eu era bestial, elegante e subtil. Quase um herói. Agora, para as hostes laranjas, sou uma besta provocadora, grosseira e fanática. «Felizmente» – com aspas, certo? – começo a ser muito apreciado por certas franjas cor-de-rosa. Para eles, é ao contrário: deixei de ser besta e estou quase a ser bestial.

Mas vamos a
outras misérias: às da nossa vida. Já disse que Sócrates me fez ter saudades de Salazar, e que Passos faz-me ter saudades de Sócrates. Hoje em dia, o poder político, diligente capataz do capital financeiro, não tem o mínimo pejo em difundir a ideia de que aos portugueses não resta outra solução se não abrir mão dos seus privilégios. Então, o que é não ter privilégios?

É trabalhar mais, por menos dinheiro.

- É não ter férias pagas, subsídio de férias e subsídio de Natal.

- É estar disponível para o seu patrão a qualquer dia da semana e a qualquer hora do dia ou da noite.

- É, mesmo com os rendimentos diminuídos, pagar mais impostos, da casa ao carro – porque ter casa e carro é um luxo a que só as elites têm direito – e sobre o que se come e se bebe.

- É pagar mais caro por consultas, medicamentos, meios auxiliares de diagnóstico, internamentos, operações, transportes, água, electricidade e gás, porque tudo isto são bens supérfluos de que só a fina-flor da sociedade pode – e deve – usufruir.

- É não ter acesso a graus elevados de ensino, porque os grandes cérebros só existem nas famílias ditas da alta.

- É não poder comprar um livro, um jornal, ir jantar fora, ao teatro, comprar um disco, ir ao café.





Não ter privilégios é vegetar-se para salvar uma economia que as elites, a fina-flor da sociedade, as famílias da alta e os políticos – no nosso caso, os senhoritos do PS, PSD e CDS/PP – destruíram.

Mas se eu chamar criminosa a esta gente, e obtusos ou pérfidos a quem a defende ou justifica, ai de mim, que não passo de um bárbaro sem maneiras.

Pronto, está bem. O vilão sou eu.



(João Carlos Pereira)


Crónica lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 02/11/2011.

1 comentário:

Anónimo disse...

Para mim está bem assim e se for para mudar é de tratá-los tal como nos tratam a nós: abaixo de cão.
PQP!