quarta-feira, 3 de março de 2010

COMO DISSE CATARINA

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A emigração voltou ao nível dos anos 60, quando os portugueses, para fugirem à fome e à miséria, procuravam no estrangeiro o pão que o fascismo lhes negava. A isto chegámos pela mão de um fulano que se olha ao espelho e se acha parecido com o George Clooney. Outra vez sem trabalho e sem esperança, milhares de compatriotas nossos, às centenas de milhares, fogem deste país em vias de extinção. Ao mesmo tempo, a fuga de capitais, disparou em 2009, subindo para os 12,6 mil milhões de euros, um aumento de mais de 44% em relação aos 8,7 mil milhões de euros postos em offshores, em 2008. Estes são retratos, entre muitos outros igualmente tristes – mas inegavelmente fiéis – do país de Sócrates.

O senhor «engenheiro» pode, desta maneira, gabar-se de mais dois recordes. Aos do défice, do desemprego, do político mais mentiroso e com mais trapalhadas no currículo, pode juntar, agora, os da emigração e da fuga de capitais. Realmente, ainda está para nascer um primeiro-ministro capaz de tanta façanha junta.

Empacotado no seu Armani, disposto a aproveitar até onde lhe for possível a vertigem inebriante do poder, determinado a compensar-se de uma juventude cerceada por rédeas de austeridade e desconforto – tempos que lhe valeram a cruel alcunha de Sapatilhas – Sócrates há muito que perdeu qualquer sentido de homem de Estado, isto se alguma vez o teve. Não é o país que lhe interessa, mas o seu ego. Não quer o poder para servir, mas a capa do serviço para gozar os benefícios que do poder advêm. Porque não é um estadista, mas um arrivista; porque lhe falta em nobreza de carácter o que lhe sobra em ambição; e porque o seu temperamento intempestivo não o deixa reflectir e ter noção efectiva da consequência dos seus actos, o resultado aí está, bem à vista de quem quiser ver: um país de rastos.

A bagunça chegou a tal ponto, que já nada espanta os portugueses. A maior trapaça já é tida como coisa comum e merece, quando muito, um desalentado encolher de ombros. A imoralidade e o desregramento instituíram-se como norma e ferramenta, a tal ponto que Sócrates já nem parece importar-se com o facto de ser acusados de coisas que, em qualquer país civilizado – à excepção, talvez, da Itália de Berlusconi – já teriam levado à demissão do visado. Chamarem-lhe mentiroso, com todas as letras, não lhe tira o sono nem lhe desfaz a pose. Perdeu a vergonha, fruto do sentimento de impunidade que lhe é conferido pela protecção espúria das mais altas figuras da Justiça. Falar-se em separação de poderes, a este nível, passou a ser um exercício de pura ficção, se não for uma anedota bem contada. Só dá para rir.

Pinto Monteiro e Sócrates equivalem-se, cada qual no seu mister. Dependem um do outro para se manterem nos respectivos cargos e para salvarem a face até onde lhes for possível. Ambos usam a negação da realidade como único argumento. Em casos destes, quando a Justiça se demite das suas responsabilidades, e é a política que a cavalga a toda a brida, só restam duas possibilidades: ou o trambolhão a qualquer momento, ou aguentar a corrida até que o país, cansado e descrente, se vire para outro lado e acabe por esquecer o assunto. Parece ser esta a aposta.

Entretanto, fruto da milagrosa crise, e em nome da recuperação económica, o poder de compra vai baixar para níveis insuportáveis e o desemprego vai subir, com o cortejo de miséria que lhe está sempre associado. As reformas, de igual modo, vão sofrer a erosão que as medidas orçamentais e as do famigerado PEC (Plano de Estabilidade e Crescimento) exigem. O endividamento das famílias vai aumentar ainda mais, tal como o das empresas, do que resultarão mais lucros para a banca e afins. E, em consequência, mais dinheiro transferido para os offshores.

Mais portugueses procurarão no estrangeiro a solução para os seus problemas. Mais homens e mulheres procurarão num segundo emprego, precário e miseravelmente remunerado, a solução que atamanque a situação sufocante em que vivem. Mais reformados serão obrigados a procurar uma nova ocupação, da qual certas franjas empresariais vão beneficiar sem dó nem piedade, explorando-os com condições draconianas. Mais jovens deixarão os estudos para tentar, também em trabalhos precários e com ordenados irrisórios, resolver os problemas económicos com que se debatem. Nesta luta pela sobrevivência, a família, como pilar da sociedade, ver-se-á ameaçada, pois não haverá tempo nem disponibilidade para a fruição do lar e da vida em comum. A instabilidade social vai agudizar-se.

Paralelamente, resultado de todo este quadro de esboroamento económico, social, político e moral, muita gente se sentirá legitimada – e, de algum modo, obrigada – a resolver os seus problemas à margem da lei. A criminalidade aumentará ainda mais, dilatando os níveis de insegurança e violência que já hoje sofremos. A sociedade, de uma maneira geral, será o reflexo do panorama de imoralidade e de pouca-vergonha que vê escorrer das cúpulas do poder político e judicial. A desmoralização alastrará, levando a que cada vez mais pessoas sintam que têm o direito de se desembaraçar de qualquer modo, de acordo com o velho adágio:
ou há moralidade, ou comem todos!

Neste panorama – e com poucos a continuarem a meter ao bolso o resultado do apertar do cinto da maioria – entraremos no círculo vicioso da contestação/repressão. Da Assembleia da República e da Presidência da República nada se espera para além do calculismo político, das contas eleitorais, dos jogos de poder, em suma. Para além de que tanto Cavaco Silva como a actual maioria parlamentar nada divergem de Sócrates e do PS em termos das receitas políticas, ou seja: o povo que pague a crise que os donos da economia fizeram e mantêm – e da qual muito aproveitam. No fundo, é a estafada – mas sempre eficiente – receita da Crise Contínua.

Fugir para o estrangeiro pode ser uma solução, mas não é a solução. Primeiro, porque nem todos o podemos fazer; segundo, porque os que ficam, ficam mais sós e desamparados; terceiro, porque só todos juntos, de mãos dadas e a uma só voz, podemos livrar o país de mentirosos e impostores e, principalmente, exigir políticas que nos respeitem, em vez de nos explorarem.

Sou um lírico? Pois sou. Mas sei, de saber seguro, que só unidos teremos força para conseguir o que é nosso. O que é? Simples. Como disse Catarina Eufémia, é «apenas» esta preciosa metáfora:

- Trabalho e Pão!

(João Carlos Pereira)

Crónica lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 03/03/2010.
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